segunda-feira, julho 13, 2015

TRAGÉDIA DA GRÉCIA NO CERCO DA EUROPA


Após 17 horas de negociações exacerbadas, após fábulas e cercos numa Europa cada vez mais encriptada, a Grécia conseguiu manter-se na zona euro, sob o peso de mil calhaus sisifianos. Merkel adoptou um pensar e um ser mais doce, talvez (quem sabe?) para travar os arranques destroçantes do seu ministro das finanças. Hora ideológica e de grupos batalhando às cegas.
João Ferreira da Cruz, economista, escreveu hoje no «Público» um pequeno artigo sob a designação (agora inquietante) de MAASTRICHT II:
Ontem, o dilema da zona euro era «sobreviver ou prosperar». «Com epicentro em Atenas, a catástrofe esteve iminente. Temeu-se pela solidariedade europeia, mas o euro sobreviverá com o repto lançado, em conjunto, por Juncker, Tusk, Dijsselbloem, Draghi e Schulz. No turbilhão da crise e na emergência da resposta para a Grécia, questiona-se o momento e o tempo que levará a "Concluir a União Monetária Europeia". Com objectivos claros, o documento dos cinco presidentes pretende averbar ganhos e progressos nas quatro uniões: económica, financeira, orçamental e política. Na primeira fase (1 de Junho de 2015 a 30 de Junho de 2017), recorrendo aos instrumentos disponíveis e ao bom uso dos Tratados, estimulam instituições e países da zona euro a impulsionar a competividade, a convergência estrutural para completar a União Financeira garantida por políticas orçamentais sustentáveis, com reforço da responsabilização democrática. Na segunda fase, o mais tardar até 2025, deverá ser completada a arquitectura económica e institucional, tornando o processo de convergência vinculativo, com critérios de referência comumente aceites, juridicamente assumidos e alcançados, condição para a participação na zona euro. Substantivamente, a convergência deixará de ser nominal, como se previa em Maastricht, para ser real. Urge colmatar os defeitos da arquitectura inicial do euro que gerou pesados custos, sofrimento social e graves tensões políticas dentro e entre Estados-membros. Sem referir explicitamente o Fundo Monetário Europeu nem o seguro de desemprego europeu, nem a agência para a gestão da dívida, nem a "regra de ouro" para o investimento (subtraído ao cálculo do défice), sequer o plano Junker ou a capacidade orçamental reforçada para recursos próprios, mas capaz de responder a choques assimétricos e apoiar reformas para a convergência, promovendo emprego, reduzindo assimetrias com regresso à coesão social, o relatório vai no sentido certo. O alarme da saga grega reclama aceleração no aprofundamento da UEM e não a espera por Maastricht II.»

Este relato desapaixonado, técnico, mostra a complexidade do processo. Mas não mostra a tensão nacionalista das populações, quase toda nas costas dos quais foi implementado o euro e a estrutura da União, nome que nem sequer se pode convocar agora, com toda a abertura, bom senso e o espírito pacificado. Os orgãos de gestão têm de funcionar, usando a rede que terá de ser remuniciada, agilizada e temporalmente eficaz. A meio de uma reunião deste tipo, não é crível que o ministro das Finanças Alemão e Merkel, cessem tudo para irem trocar pontos de vista a sós. Quem convoca quem? E quem apaga os egoismos nordestinos e as humilhações a sul? A tragédia grega não tece, desta vez, um mítico personagem que prefere a cegueira a viver à luz do seu transcendente pecado.




sexta-feira, julho 10, 2015

OS MUROS CEGOS E MUDOS QUE CERCAM OS POVOS


Este é o velho muro de Berlim, ainda de pé, hoje já apagado e as duas Alemanhas unificadas. Esta não foi a primeira tragédia, neste domínio, vem de longe a ideia de sequestro, de corte de vias, de aprisionamentos perante o fluxo vital de certas populações, trabalhando, afinal, do outro lado, em regime escravo.
A grande agitação que atravessa o mundo em todos os sentidos, abrindo e fechando vias de negócio, envolve vagas humanas de migrantes. Milhares de pessoas procuram furar esse hediondo muro horizontal, o Mediterrâneo, em busca de melhores condições de vida no norte da Europa. A União Europeia endurece. E apesar disso vemos uma Itália humanitária atenta aos milhares de emigrante espoliados na fonte por 80.000 euros às mãos de traficantes que os atiram, em carradas suicidas, para barcos de borracha ou embarcações sobejamente danificadas. 


Milhares de emigrantes que atravessam o Mediterrâneo até Itália, morrendo por vezes às centenas, visando, em terra, aceder ao norte, pedem alojamento, alimentação e medicamentos.                  




A ONU aborda (é uma palavra curiosa) o impacto humanitário do muro de bloqueio na Palestina - Portal Vermelho. Onde terá ficado, em fatias, o muro de Berlim, nódoa que se espalhou, como se vê por diversas áreas de conflito, e as ornamentou e se tornou símbolo? Monumento ainda, em pedaços, vozes da libertação e peso grafitado de todas as esperas que ainda nos esperam.
Em 2002, o governo israelense, liderado por Ariel Sharon, decidiu implementar a construção de uma "barreira de segurança", como ficou conhecido em Israel o muro segregador, alegando o objectivo de impedir ataques de palestinos contra israelitas. Um exemplo "benemérito" dos judeus outrora torturados e mortos pelo império Hitleriano.



Vem a propósito assinalar esta imagem dos muros no século XXI: aqui vemos, simplesmente, não  os judeus a caminho das câmaras mortíferas, mas simples palestinos aguardando junto de um dos portões do muro israelita. E há muito para dizer na faixa de Gaza, a tal zona que mais parece um campo de concentração e que o Estado Islâmico tem em vista assaltar, degolando os chefes.
O problema foi também assumido pelo sombrio governo da Hungria: o país pediu autorização à União Europeia (e esta concedeu) para a realização de um muro de bloqueio, contra as vagas emigrantes, obra apenas com quatro metros de altura e 175 kms de comprimento. Será que isto vai acontecer nas costas do norte, do sul e do ocidente? Não pedimos nada disso e a Grécia solicitou um acordo onde algumas escolhas soberanas favorecessem a sua dieta.



Não é difícil perceber quem são estes personagens e que construção tão minimalista é esta parede em módulos, sem janelas nem portas.



Seja como for, neste mundo dourado faz-me lembrar, sem apelo, aquele solitário suicida descendo em pleno espaço, de cabeça para baixo e uma perna dobrada quando do atentado às torres de Nova Iorque pela al Qaeda.

domingo, julho 05, 2015

LI E DESEJEI TER DITO ESTAS PALAVRAS

 
O exemplo de uma civilização agora desentendida na sua tradição para as concepções actuais da realidade comunitária e das democracias


Miguel Sousa Tavares escreveu a propósito da situação na Grécia:

«Faço minha a pergunta de Martin Wolf no Financial Times: se eu fosse grego, como votaria amanhã? A pergunta não tem uma resposta boa porque ninguém sabe o que se seguirá, quer ganhe o sim quer  ganhe o não. Ninguém sabe o que fará o errático Governo grego, que tão depressa faz discursos inflamados contra os credores, como logo a seguir aceita todas as suas exigências. E ninguém sabe até onde irá a vontade primitiva dos credores, pois só isso os move: do ponto de vista negocial, eles já colocaram à Grécia de joelhos, com excepção de uns míseros pontos de diferença no IVA para  as ilhas e mais uns cortes em algumas pensões de reforma. Mas, pior ainda, ninguém sabe ao certo o que esta gente quer fazer da Europa. Ou mesmo se a querem.  


A Europa que eu vi formar-se e abrir as portas a Portugal era dirigida por gente como Willy Brandt, Helmut Schmidt, François Mitterrand, Olof Palme, Harold Wilson, James Callaghan, Bettino Craxi, Felipe González, Mário Soares. Todos eles tinham uma ideia de Europa onde se espalhavam os melhores valores da civilização europeia, como um todo, e oculta da grande finança para expulsar do euro os que só enfraquecem a moeda; há quem pense que se trata antes de uma vendetta histórica da direita sobre décadas de predomíno intelectual e político da esquerda e uma oportunidade imperdível de aplicar a sua agenda em termos irreversíveis. Mas provavelmente é tudo menos grandioso do que isso: apenas uma terrível combinação entre ignorância e insensibilidade. Fixemos os seus nomes para memória futura: Merkel, Schäuble, Dijsselbloem, Lagarde, Junker, Rajoy, Passos Coelho, e alguns outros personagens menores.»
                   

e então há quem pergunte
QUEM É ESTA GENTE?