domingo, janeiro 08, 2012

COLISEUS COM RELVA E GLADIADORES NO SÉC XXI



Não há forma de olhar para a violência destes «gladiadores» sem nos lembramos de outros (igualmente do nosso tempo mas menos disfarçados). No caso do rugby (futebol americano), toda a patética blindagem dos jogadores é uma defesa que apenas excita maiores expedientes tácticos de brutalidade: não há desporto, não há verdadeiro respeito pelo ser humano como personagem de um jogo, o espectáculo é avassalador no Coliseu contemporâneo.
O futebol que se pratica em Portugal e um pouco por todo o mundo, enferma dos mesmos males, apesar de parecer mais leve e as defesas do corpo serem mínimas, limitando-se às caneleiras para as pernas. O espaço onde se joga é um recinto rectângular, com chão relvado, e grandes bancadas em volta, por vezes separadas do campo por valas ou redes de contenção do público. Porque a evolução deste espectáculo industrializado tribalizou muito os grupos, tornou-os rivais e não adversários desportivos, promoveu a criação de claques agressivas que saltavam para o relvado e chegaram a provocar verdadeiras catástrofes, tendo sido a Inglaterra o país que mais legislou sobre o assunto e tomou medidas radicais com a proibição das claques organizadas em grupos capazes da prática do vandalismo e de agressões premeditadas aos adeptos de outras equipas.
É uma espécie de carnificina, sem equilíbrio nem ritmo, o que os espectadores de futebol vão, parece que em jeito de catarse, olhar e seguir nos nossos estádios. O endeusamento dos «gladiadores» do futebol exacerba tudo em volta e a própria engenharia financeira de compra e venda de «intérpretes» funciona na mais promíscua das trocas e especulação de um lado para o outro. É suposto haver regras no futebol. E não são poucas. Equipas de arbitragem seguem de perto toda a partida e zelam pela marcação de faltas que contribuam para um jogo mais leal e menos lesivo da própria estética que envolve. Há países, em especial a Inglaterra, espaço de origem do futebol, em que os treinadores e as equipas primam, em larga medida, por disputas territoriais de malha larga, com precisão nas trocas de bola e mesmo na corrida de combate ou nos cruzamentos sobre a grande área. O que vemos, nesses casos especiais, são jogos de forte personalidade atlética em bons espectáculos de futebol, um ritmo bem balanceado entre estruturação e ataque, descongestionamentos na boa conta das lateralizações, tudo em ordem a que a violência corpo a corpo a corpo não se verifique ou não seja mais do que afloramentos sem dolo.
Em Portugal, para não falar noutras áreas da chamada latinidade, o investimento no futebol é desproporcionado e a cultura pela excelência um mito, incluindo treinadores (os «misters») e tropas de defesa e ataque, desde portugueses a reforços internacionais de grande cotação na respectiva bolsa de valores. Uma certa corrupção indisfarçável capeia em alguns recintos e linhas «tribais mistas». O arrebatamento é mal travado, os árbitros não conseguem fazer escola, os dirigentes especulam com as mediatizações. E o que vemos no terreno é um péssimo futebol, onde estiolam jogadores bons, por vezes bandos de gladiadores a perseguirem o condutor da bola, corridas tolas, sem nexo nem bom fim, tudo se misturando numa pequena área do campo. Cruzam-se pontapés de ameaça, outros de desconcerto, muitos corpo-a-corpo em que os jogadores disputam a vantagem sobre a bola com prisões às camisolas, travagem com braços e pernas, assim durante quase toda a partida, com lesões, paragens infinitas, faltas de cartão amarelo ou vermelho, abundância de livres e infracções graves para penalti, casos de indecisão e disputa verbal contra a marcação do erro ou contra a sua improbabilidade.
Para abreviar, o futebol praticado desta maneira, nada tem a ver com desporto ou espectáculo. Tudo se passa numa arena de lutas e assombrações. E o que me faz assinalar esta questão, apelando para se estudar a melhoria do jogo e das regras, é justamente por pensar que o corpo dos jogadores está cada vez mais exposto à barbárie pela vitória, sendo fácil listar os «crimes» cometidos ao longo de um ano.
Proponho daqui, é apenas um acto de cidadania, que se implemente um futebol (novo) em que não seja permitido o contacto físico jogador a jogador, apenas dispensando de sanções ocasionalidades óbvias. Isto permitiria civilizar e abrir o jogo, o qual passaria a ser feito em maiores áreas de avanços e recuos por troca de bola. Esta concepção de um outro futebol teria certamente um vasto incremento do apuro técnico e físico dos intérpretes, menos recurso à fraude e quesílias, a par
de aprofundamento das linhas de arbitragem e do ritmo e da beleza de um jogo cuja matriz mais evoluída é alinhada, com efeito, por esta perspectiva prática e teórica, a registar em regras adequadas.

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