domingo, agosto 21, 2011

A EUROPA ONDE VOLTAM A MANDAR OS MESMOS


Chegámos a casa embrulhados em papel de jornais, papa já quase reciclada sob a flagelação da chuva. A ideia de ver e ouvir a senhor Angela Merkel e o senhor Sarkozy, ali convencidos do que diziam, e diziam pouco, não foi grande coisa, embora os anúncios nos indiciassem novos métodos a fim de travar a derrocada da Europa, tão outra relativamente à inicial e aos grandes homens que a pensaram. A congregação multiforme mas numa união solidária surgira mais no início, antes da concepção do euro. Tudo configurava outros modelos de avanço comunitário, assente noutros pilares e numa linha perspéctica de contextualização relacional humana, quer de um ponto de vista político, quer em ordem a dimensões económicas e sociais. Pensava-se então numa mais equitativa repartição dos tempos e fundos ligados ao pagamento das dívidas soberanas, algo que mereceu uma veemente recusa da senhora Merkel, em plena conferência pública, comunicação assumida por ela e pelo Presidente Francês, um ao lado do outro em sínteses que faria sorrir em prosa o fundador Delors, figura angular do verdadeiro espírito da construção da Europa, perante um mundo e forças demográficas ou económicas a que era preciso fazer frente, reafirmando a harmonia e a paz.

Sarkozy e Angela Merkel

Esta Alemanha tem que se lhe diga, teve sempre, e bem se recordaram algumas personalidades de verdadeira grandeza no país como, depois da guerra, houve nessa área manejos na linha de especiais, negócios, créditos e engenharias financeiras, criando expedientes para seu crédito, algum tempo depois da guerra, contornando regras de produção. Este tipo de «agilidades», projectando-se na realidade industrial e na economia, à margem do que que faziam as outras potências, porque conservavam princípios éticos que a situação havia aconselhado, ao contrário do que fizeram os alemães.
Significativamente, enquanto recusava a ideia dos eurobonds na televisão, viram-se saltar da boca de Merkel partículas de saliva: ela parecia nervosa porque advogava primeiro a disciplina e certamente já ouvira comentários aos disparates inerentes às ideias que apregoara, sempre colada a Sarkozy. Sobre os chamados eurobonds, onde alguns economistas advogam potenciais e positivos efeitos, Merkel remete o problema para uma década de distância. Excita-se: «que querem de nós aqueles que nos apontam tais caminhos, o das obrigações europeias, agitando trocas em benefício dos trabalham menos, processo que nos impediria de castigar os que se orientam com pouca disciplina»
Esta senhora, contrariando a estabilidade de Europa com a centralização de poderes, aliás partilhados com os franceses, determinou a criação de um novo governo para a Europa, taxas sobre operações financeiras (bolsas) e dois presidentes que se reuniriam duas vezes por ano com o governo, incluindo um segundo ministro dos negócios estrangeiros.






















Ninguém percebe a invenção de um novo ministro dos NE da UE, a enquadrar porventura no tal governo do dueto, aliás possivelmente em regime de passear pelos tais países periféricos, com as suas imposições, com os seus alarmes. A crise acentua-se em todo o mundo. Os governos do futuro, ainda infederados e vítimas de grandes massas de poder exógeno, dilacerando as utopias e as constante renovações de penúria, estarão ameaçados de perder as suas âncoras de relação solidária, estruturas mal reguladas pelos peixes gigantes dos grandes fundos marítimos. Delors sorri. Não haverá mais a ideia do mil anos para a Europa unida em certo sentido. Delors sorri. Alguma vez a Europa poderá consolidar um projecto assim, comportando-se entre assimetrias e complexas fugas às massas humanas que emergem do sul e do leste? O projecto de uma forte e consequente área de civilização está de pé em muitas consciências mas esboroa-se noutras. A ideia inicial passava pelo número de ouro e pela estabilidade onde convergiam ciências, artes e gestores de sociedade, homens sábios e do espírito. Disfarçadamente ou não, os povos continuam a querer mais meios financeiros, mais poder, mais delírio consumista. E quando tais povos somam mais de metade da demografia do planeta, incapaz da minimização dos sonhos autofágicos, bizarro seria que alguma coisa se salvasse.
Na Europa, eventualmente num lugar assimétrico e pacífico, com um plano técnico e de excelência, todos os governos e sábios convidados devem reunir-se para resgatar valores e projectos em perda, tratar de ratificações e rectificações, em larga reconstrução de novo começo, livre de burocracias obsoletas, de planos risíveis como vimos há pouco de um casal impetuoso e divertido, algo bem dirigido contra os rápidos atritos entre ricos e pobres, atritos do sonho e tendo em conta as graves humilhações que rapidamente se instalaram na chancela dos documentos sem fim.
Ao contrário, as apodrecidas periferias da Europa, ideia xenófoba que os aristocratas do Norte dizem abanando cada vez mais a cabeça. Esquecem-se que a pobreza, há anos situada abaixo do Norte de África, já se encontra acima do Mediterrâneo, proeza que os próprios sistemas ricos, de orelhas tapadas pelas peles dos desportos sumptuosos e caros. Acabarão por deixar-se mudar ao acaso e a a Alemanha terá fronteiras sem nada em redor, sozinha, periférica de si mesma diante do pântano de que falava António Gueterres. Os alemães serão vítimas da sua própria grandeza (o que já aconteceu por mais de uma vez), vivendo ainda os gostos e os abusos da civilização global. Tudo o que cresce assim, enterra-se no lixo e contrai doenças novas. Obama que o diga, parece um esquecido grande jogador de basquet isolado e fora de moda. Sentir-se-á fustigado por gente que não sabe o valor dos lugares e das culturas, sem perceber o sentido da geografia humana, da saúde, dos mercados regulados a sério e fornecendo ao indivíduo não apenas crenças e mitos mas sobretudo o espaço da Educação vivida também para fora e fornecendo ao indivíduo uma espécie de criação de sortilégios, no bom sentido, ou seja a fecundação dedicada a quem somos e não ao consumismo que nos impingiram e nos vai destruindo.