sábado, novembro 17, 2012

NOVA IORQUE NÃO É SÓ MANHATTAN VISITÁVEL

Nova Iorque 
 
Nova Iorque ou a América e o seu lado invisível

Após a passagem sobre Nova Iorque do violento furacão "Sandy", muitos americanos terão perguntado se a América é de facto a grande fortaleza que pode desafiar o planeta e se as zonas atacadas por aquele fenómeno terão condições para se adaptarem a um clima mais bizarro e aterrador, fruto das leis cósmicas ou da poluente actividade humana. Clara Ferreira Alves escreveu no Expresso desta semana uma pungente e lúcida crónica sobre este acontecimento e acerca da América em geral, os seus recantos mais encobertos onde vivem populações mistas, relegadas para quotidianos absurdos, em graus de medianos e de pobreza incompatíveis com mais furacões.
Viajando numa boleia especial para aceder às Rockaways e à catástrofe no seu melhor perfil, Clara fala-nos de de túneis «fechados, inundados» e de escolas que tentam recomeçar a sua vida embora nem todos os transportes públicos estejam a funcionar. «O caos nas ruas é evidente e os táxis buzinam e quase atropelam as pessoas nas passadeiras. Uma medida de civilidade começa a escassear com a passagem do tempo. Bloomberg, o mayor de Nova Iorque, foi às Rockaways e foi insultado por meia dúzia de moradores desesperados.» A  América, em boa verdade e perante os aspectos obsoletos de muitos equipamentos, tem de repensar as suas infraestruturas e a sua dependência energética. Na recente situação, as centrais nucleares resistiram ao "Sandy," mas as redes de distribuição eléctrica e as vias logísticas capotaram. Os que não abandonaram as casas, por pensarem que acabariam roubados caso se afastassem delas, ficaram na mesma sem nada e agora também não podem  deixar o que lhes resta, porque os assaltantes andam por ali. Alguém contou à jornalista que, num escasso tempo de vinte minutos, ficara com água pela cintura. Usaram o sótão. E viam o mar pelas ruas, enquanto o vento era tal que não ouviam as vozes uns dos outros. «O trauma é imenso.» Uma lágrima desce pela cara de um cidadão, Gary: é uma lágrima silenciosa que ele enxuga com luvas sem dedos.

EM PORTUGAL, ONTEM, UM TORNADO
PROVOCOU DESASTRES DEVASTADORES
NO ALGARVE, EM LAGOA E SILVES

Tornado em aproximação da
costa Algarvia 

passagem por estradas

varrimento em Silves

dezenas de carros destruídos

centenas de árvores arrancadas dos
parques, avenidas e outros locais 

 talvez as alterações do clima e
respectivas catástrofes não sejam
nenhuma história boateira em Quioto
 

E assim decorreu um dia: a Câmara de Silves apelou aos cidadãos do Concelho para uma ajuda. Apareceram cerca de mil pessoas com camiões, carrinhas, serras mecânicas, todos os utensílios. Limparam numa manhã todos os destroços da baixa e ainda colocaram as telhas no edifício da Câmara Municipal, entre outras ajudas assim. O que digo aqui sobre Quioto é que, no dia da sua assinatura, países como os EUA não assinaram, desdenhando dos «boatos» sobre as transformações naturais e produzidas pelo Homem no clima do planeta. Não alinhei nesse boato. Há muito que sei o que esta civilização pode  provocar, refém de certas tecnologias e do petróleo, além de teimar nas apocalípticas concentrações urbanas.
RS

sábado, novembro 10, 2012

BARACK OBAMA VENCEU A AMÉRICA CONGELADA

BARACK OBAMA

Com as crises que assolam o mundo, e apesar de um eleitorado que se deixou congelar com a perda das expectativas criadas há quatro anos por Obama, a América viveu um tempo eleitoral dramático, com os candidatos  praticamente empatados. Dos três debates, Obama saiu por cima nos dois últimos. E o seu mandato foi sacudido por graves problemas, sobretudo com o crash de Wall Street e muitos dos seus efeitos em cadeia, as oposições ao serviço de saúde, a emergência dos sectores multimilionários (como o seu rival  Mitt Romney) numa colagem às forças mais conservadoras. Nos Estados mais propícios a um discurso menos acossado pelos adversários, definindo-se na sua lógica e na sua perspectiva humanitária, Obama arrancou de facto a vitória, logrando um número muito mais expressivo de representantes para o Colégio Eleitoral (303). O futuro que o espera, apesar do seu talento e uma perspectiva mais moderna e aberta para os EUA, não é fácil de enfrentar, mas as suas palavras reeditam bem, de novo, a esperança e a vontade.

ÂNGELA MERKEL, SEGUNDA - FEIRA, 12, EM LISBOA

CHANCELER ÂNGELA MERKEL

Clara Ferreira Alves, na sua crónica da revista do Expresso, escreveu hoje, sábado, a dois dias da chegada a Lisboa da poderosa Ângela Merkel: «o que quer que se tenha desatado na solidariedade da zona euro, está desatado para sempre.»
É inquietante, talvez releve da globalização e de certas heranças alucinantes para mil anos, mas, seja como for, trata-se de um fenómeno cada vez mais impiedoso. A Europa, a que já chamámos verdadeira e polo avançado da civilização Ocidental, já não existe, soçobra na conspiração universal de um capitalismo inominável, com mecanismos odiosos e criações ilusórias, selvagens, sob domínios que se acentuaram com a pulverização  do comunismo e a enxurrada que atravessou (de várias maneiras) o destruído "muro" de Berlim, além do equívoco "jardim" das chamadas grandes potências emergentes. A Alemanha zela por si, mesmo que venha a ser submersa num oceano de milhões de chineses, trazendo de volta as fabriquetas que para lá exportaram. A Alemanha trata dos seus traumas de guerra, reconquistando o velho jeito de mandar, de cobrar a regra, cabelos louros, raça única, amiga dos antigos países ocupados pela União Soviética (onde ganha fortunas) e dos enregelados mas superiores países do Norte, e hoje, com Merkel, é o símbolo avassalador de panos económicos (austeridade e pobreza em vez de destruição de fábricas e bens fúteis) que relevam de previstas destruições do equilíbrio federativo e solidário, estados cada vez mais equívocos neste mundo que nem respeitam uma das mais raras criações do Universo o Homem.
Cercada pelos agiotas da conspiração do dinheiro, da guerra financeira que vai esmagando toda a civilização contemporânea, a Europa, com países afundados ou quase, a caminho de uma pobreza generalizada, é hoje um «lugar de catástrofe». Em redor dos areópagos de cínicas escolas de economia, soprados pelo crash de Wall Street, propagam-se guerras completamente irracionais, na Síria, na Ásia, no Médio Oriente, assaltos militares, golpes de Estado, terrorismo, um clima ao qual a Natureza responde com outras agressões, apesar das populações vitimadas continuarem a voltar ao fanatismo do crescimento, multiplicando o nomadismo das unidades industriais em nome do progresso (apenas dinheiro assimétrico), tudo numa desagregação imparável, milhões de mortes encobertas e de riquezas expurgadas a povos ainda primitivos, «libertados» euforicamente pelas elites da descolonização, continentes abandonados, territórios vazios e cidades explodindo de ensandecidos rios de gente.
Fazemos votos pelo bem estar da senhora Merkel e desejamos que, ao chegar à Alemanha, não a encontre submersa por 500 milhões de chineses, todos finalmente bem pagos.

quinta-feira, novembro 01, 2012

O HOLOCAUSTO NÃO SE ENSINA POR CONTRATO

Numa sessão dedicada à relação Portugal/Israel, o embaixador israelita Ehud Gol no nosso país teceu críticas ao papel das autoridades portuguesas na escassa abordagem do Holocausto e outras tragédias judaicas. Foram muitas as pessoas que se espantaram. Sobretudo os que conhecem muitos casos de apoio aos judeus através de Lisboa e o extraordinário trabalho de Aristides de Sousa Mendes, entre outros. Ehud Gol, com muito zelo e pouco respeito pela história alheia, lamentou que Portugal tenha sido o único país que colocou a sua bandeira a meia haste durante três dias quando soube da morte de Hitler. Entre várias considerações desrelativizadas, o embaixador considerou, em «Portugal e o Holocausto», que, por concordância entre os dois países, o Holocausto deveria passar a ser ensinado no nosso plano escolar, agora e de futuro.
Tudo isto é um pouco estranho: primeiro, porque em Portugal, sem contratos, sempre ouvi referências, filmes, peças de teatro, tendo, a par, lido livros em português sobre aquele assunto, tema, aliás, que toca de perto a minha própria obra artística. A bandeira a meia haste mostra bem como certas entidades estiveram de costas voltadas para os efeitos e mordaças do regime de Salazar. Ele foi responsável por essa bandeira chorando o mito e uma derrota justa. Esta espécie de marketing desenvolvido em torno do Holocausto, quase proferindo a conveniência do seu ensino por contrato, é hoje um mau culto da memória desse infausto acontecimento, sobretudo quando Israel não prima pelo respeito dos vizinhos que conquistou e pelo precário ensino que desdobra sobre o mundo contemporâneo, reclamando para si direitos muitas vezes desfocados ou inexistentes. A evocação, no século XXI, do Holocausto deveria preocupar o senhor embaixador a par de outras realidades em que houve participação internacional e portuguesa, incluindo a morte, em dois meses, de 800.000 cidadãos  entre o Uganda a o Ruanda, bem como a tragédia da Somália, o avanço soviético pelo Afeganistão, a caducada intervenção nesse país dos EUA, as manchas de obscurantismo e grande número de assassinatos de marca talibã, um movimento de medonhos contornos como ameaça à parte mais avançada e lúcida da civilização contemporânea. Enquanto os nazis procuravam exterminar judeus de forma pragmática e absurda, os Aliados cediam à História quarenta milhões de mortos e ainda contribuiram, sem verdadeira legitimidade geográfica, demográfica e histórica, para instaurar na área palestiniana o Estado de Israel.
O reitor da Universidade de Coimbra, perante a referência da «nódoa» da bandeira a meia haste, disse: «Recuso-me a suportar o peso dessa nódoa. O passado é doloroso. O Portugal de hoje não é o mesmo do passado, como a Alemanha de hoje também não é a mesma do passado.» Gol ainda insistiu que os países têm de assumir as responsabilidades pelo passado, depois de ter exclamado que o facto citado «é uma nódoa para nós, judeus, vai aparecer sempre associada a Portugal». Era preciso chamar a atenção ao senhor embaixador para o contexto dos factos e sobretudo para as próprias responsabilidades de Israel, que os países europeus têm reconhecido e ajudado, incluindo Portugal em diversos campos, naturalmente sem o poder e os interesses americanos.