quarta-feira, abril 28, 2010

AGÊNCIAS DE NOTAÇÃO FINANCEIRA OU DEUS

imagem do parlamento da Ucrânia


ministro português Teixaira dos Santos
Cada dia que passa e cada jornal que leio rasgam fogueiras nas noites do meu psiquismo. A Rússia quer mais quarenta e oito anos de estacionamento da sua frota de guerra na Crimeia. No parlamento da Ucrânia, essa força aceite pelos deputados pró-russos teve a oposição violenta dos deputados da oposição pró-ocidental. A imagem mostra um mínimo instante da batalha com chuva de ovos, socos e puxões de cabelos.
Poderão dizer-me: em Portugal isto não acontece. Eu acho que acontece, mas por meios menos transparentes, quer escudados em obtusas comissões de inquérito, por dá cá aquela palha, quer alargados a raivas incontidas contra o governo, entre teorias da conspiração e desentendimentos bravios de tudo o que dizem os partidos, uns contra os outros, alguns em campanhas de zelo contra todos os magalhães do mundo, sócrates da eternidade, ferreiras de mandatos obstinados de cinco meses, atrasando o trânsito e navegando em contra-mão. Ninguém quer falar da crise numa perspectiva global, no quadro de uma catástrofe gerada pelos donos do mundo, do capital que escondem e mostram em breves inserts para derrubar bolsas, moedas, comunidades. Tais forças, perante as quais nennhum Sócrates nem nenhum Passos podem seja o que for, já não se bastam com os seus monopólios e grandes grupos de pilhagem: têm agora diversas correias de transmissão, que põem e dispõem, sem que nenhum tribunal da decência os salpique de ácido.
Foi assim, mais uma vez, com Portugal: suas Excelências da agência de notação financeira Standart & Poo'rs (S&P) cortou o rating da dívida da República Portuguesa, passando dos anteriores A+ para A-, um corte de dois níveis de que não há memória no mercado português. O outlook permanece «negativo».
Estas palavras são citadas de um artigo de Paula Cordeiro, no «Diário de Notícias» de hoje. Toda a lógica de fundo da União Europeia começa a ser posta em causa, ou por ela mesma ou por forças colossais que espreitam a falência dos Estados sociais, abrindo veredas e túneis a fim de desmoronarem governos, países, centenas e centenas de anos de diversos patrimónios nacionais.
Tudo está sendo embrulhado em muretes e muralhas e entidades surgidas não se sabe de onde, comandadas não se entende como, com tabelas em computador, analisando estatíscas ou informações obtidas a distância. Portugal não tem que ser metido na alhada europeia toda ou noutras alhadas a Ocidente e a Oriente. E digo isto porque as leis tratadistas em que nos embrulham superam o que foi negociado em Lisboa, sendo as assimetrias na Europa cada fez mais despudoradas, desde as longínquas calibragens de frutos, orientações exteriores à memória histórica e cultural do país, abate de grande parte da frota de pesca, da agricultura que nem sequer bolia com a francesa, tudo assim, ensarilhado em orgãos majestáticos de enorme luxúria de meios e pouco entendimento das periferias, das populações ou dos ventos que sopram colonialmente sobre as nossas pobres imitações de cosmopolitismo, ideia decadente em si mesma.
A Grécia foi (com graves faltas dela) o vértice de um vórtice com o qual Alguém quer devastar o euro, as agências feitas de homens que nenhum de nós conhece e que nunca debaterem nada com o mundo, nos grandes plenários que a tecnologia permite. Não ouvi mais falar numa nova estrutura coordenadora e fiscalizadora do sistema bancário nem me parece que as tais agências tenham uma concorrente europeia digna de crédito real e mediático. Assim, os interesses dos grandes Estados são motores de crises sobre crises, a luta de mercados inúteis, de moedas patéticas, de redes para o tráfico de influências, promiscuidades várias, corrupção e deuses inacreditavelmente vivos e livres nos seus grotescos pés de barro.
«É tempo (disse Teixeita dos Santos) de o Governo e os partidos, em especial o PSD, se entenderem quanto a isto (medidas necessárias). É preciso focar a atenção no que é e deve ser prioritário para o País, pois as dificuldades ainda não acabaram. O país está a atravessar um momento decisivo (...) e tem de saber responder a este ataque dos mercados»

quinta-feira, abril 15, 2010

AS CITAÇÕES DITADAS AO NOSSO QUOTIDIANO



de PLUMA CAPRICHOSA
Clara Ferreira Alves



ÚNICA









Na sua crónica
Somos um pequeno e desgraçado país
temos uma elite sofrível e uma classe política sem cultura política nem histórica

Sai-se da pátria e regressa-se à pátria e as notícias são as mesmas; é como se o mundo girasse e nós parados. à espera do apocalipse. Tudos nos diz que amanhã será pior e toda a gente nos pede mais sacrifícios, mais penúria e mais infelicidade. É impossível levantar um país de vencidos ou convencê-lo a fazer alguma coisa por si. Leio as notícias sobre o extraordinário salário de António Mexia, da EDP, os 3,1 milhões anuais, e penso o que pensa uma pessoa normal: não vale a pena. Os velhos morrem de frio no Inverno porque não têm dinheiro para pagar «a luz» e o senhor eneria tem um salário igual ao dos melhores 200 gestores americanos. Numa empresa falsamente privatizada que floresce num regime de monopólio e em que o Estado é o maior accionista. E aquilo é o salário, fora os benefícios e os cartões. Fora as reformas e as pensões. A permanente resignação perante a imoralidade é que nos torna passivos, fracos, assustados, irresolutos e cúmplices da delapidação do nosso dinheiro. E um governo socialista autorizou isto e promoveu isto. E pior do que isto. Não se trata de premiar o mérito, trata-se de premiar a estupidez. Porque deixamos isto passar.
(...)
Em Portugal, deixámos de ter símbolos e não temos modelos. O português mais influente é um jogador de futebol. O segundo mais influente é um treinador de futebol. E ponto final. Temos uma elite sofrível e uma classe política sem cultura política nem histórica, ludibriada por autodidactas ou por rapazes com cursos tirados no estrangeiro e que chegam a Portugal com um objectivo: enriquecer. Enriquecer à sombra do partido, do padrinho na banca e do Estado. De nós. E a justiça trata de si e dos seus privilégios. Somos um pequeno e desgraçado país.

quarta-feira, abril 14, 2010

AS CITAÇÕES DITADAS AO NOSSO QUOTIDIANO



de A ESPUMA DAS COISAS
António Mega Ferreira

Notícia







Este espectáculo de encenação de um pseudomartírio pela liberdade atingiu o auge com o desfile de «pressionados» e «pressionantes» a que a Comissão de Ética da Assembleia da República deu guarida, palco e tempo de antena, nas últimas semanas. Não posso deixar de notar, como cidadão, que, enquanto se tratavam questões de imperioso interesse nacional como o Orçamento e o PREC, ou as eleições para a liderança do principal partido de oposição, as páginas dos jornais e os noticiários de televisão foram servindo de câmara de eco a um cortejo de lamúrias, indiscrições, meias-verdades e delações que, à hora a que escrevo esta crónica, já tinham chegado a Morais Sarmento (que foi ministro de Durão Barroso) e a António Costa, que não está no governo há três anos. Francisco Balsemão, que, além de empresário, sempre foi jornalista, encarregou-se de relativizar estas «pressões», ele que, tendo sido primeiro-ministro, deve saber bem do que fala. Mas, para lá da reverência da praxe, ninguém lhe prestou atenção.
Há clara desproporção, parece-me, entre o alarido e a matéria de facto: por enquanto, do alegado plano governamental para o controlo dos media só há a convicção não fundamentada de três ou quatro jornalistas e não-jornalistas, expressa por vezes em termos histriónicos e despropositados, infelizmente tolerados pelo presidente da comissão. Tudo, claro está, ouvido da boca de terceiros, porque ninguém falou de «pressões» directas, o que deixa bem claro que as mesmas nunca existiram. O momento mais hilariante foi o da mirabolante «revelação» de que o primeiro-ministro teria telefonado ao Rei de Espanha para lhe pedir que intercedesse para o afastamento de uma apresentadora de telejornal de um canal privado... Que ego, senhores, que ego!

terça-feira, abril 13, 2010

AS SUAVES SESSÕES DA JÚLIA DOS ESPÍRITOS


Meus aigos, esta é a imagem digital do protoplasma da Júlia, distinta apresentadora de televisão e que ultimamente nos tem presenteado com sessões finíssimas da mais transcendente estrada de comunicação entre a nossa palpável e medíocre dimensão de humanos com o espaço onde se deslocam, invisíveis quase sempre, os perespíritos e os espíritos que nos são próximos ou distantes, a maior parte dos quais parecem divagar (cómoda ou incomodamente) pelos lugares da sua vida carnal, pelos sítios onde se deslocam os seus parentes queridos. Júlia dos Espíritos acompanha uma medium inglesa, soft e certeira, claramente ao vivo, todos ao vivo e no meio da maior das claridades. Como se vê, trata-se de uma espécie de laboratório nada semelhante às difusas e sonurizadas sessões dos tradicionais espiritas. Aqui pode haver gente como o Rui de Carvalho, leve, sério e confirmativo. E outra gente com a mesma placidez bonita, sem ansiedades, nem dores, nem esquizofrenias. São todos e todas como maçãs maduras, limpas e sem bichos.
Júlia Pinheiro (dos Espíritos) diz à senhora (inglesa) para começar. E ela, de pé, sem formalidades, com voz natural, aponta para um dos circunstantes: «Este, por exemplo». E Júlia diz que vamos começar e que ela será intérprete das falas da senhor vidente. Parece uma representação lindamente estudada em casa, tão bem, tão bem, que a própria apresentadora, conhecida por ser esganiçada até ao cansaço dos ouvintes, sucumbe ao milagre de falar em tom natural, na mais fluente e doce das traduções. «Aquele senhor tem uma figura de mulher junto ao seu ombro. Usa um chapéi de palinha, é branca, usa um belíssimo vestido de verão. Ela diz que continua a amá-lo muito, mas revela-se perturbada ao lembrar o filho que perderam num horrível desastre. O homem leva a mão aos olhos, também perturbado, mas recompõe-se depressa». «Que pode dizer-nos sobre isto?», pergunta a Júlia do Espíritos. Ele diz que sim, que é verdade, o filho morreu há um ano, num desastre de mota, dois anos depois do falecimento da mãe, ainda jovem.
Esta é uma narrativa possível do que acontece naquele programa. Se fosse possível ter esta internet dos mortos, com um motor de busca bem superior ao Google, um mundo já tinha dado uma volta muito grande, transfigurando-se em muitos aspectos. E teria sido prestado um serviço inestimável às religiões, incluindos aquelas que acenam céus palpáveis, capazes de convencerem o mais empedernido dos homens a se suicidarem, fazendo-se explodir com bombas, assim combatendo o inimigo na Terra e catapultando-se para lugares paradisíacos, onde o amor tem novas cores.
Esta total e grosseira falta de respeito pelos que estudam a eventual sobrevivência da alma, ou se ela existe e como, com que propriedades, porquê e para quê, é conenável. Um travestimento desta natureza, sem que ninguém se indigne, não pode passar por entretenimento: é um jogo preparado para criar expectativas palpitantes nos crentes, algo «dizível» daqueles dois mundos. Mas eu não sei se o jogo se chama embuste, ou outra coisa pior, e não percebo como se mantém em emissão, com a maior naturalidade, um tão grave atentado à nossa inteligência e condição humana. Ou será que só a política, rasteira, de idêntico nível, é aconselhada à moderação ou mesmo a sair de campo? Perguntem à Manuela Moura Guedes se quer participar no programa da Júlia dos Espíritos. Não sei se ela arrasta maus ou bons espíritos, mas repetirá sem papas na língua o que lhe comunicarem do Além, doa a quem doer. Júlia, isso não é deontologicamente aceitável, nem com falinhas mansas.

sexta-feira, abril 02, 2010

PORTUGAL E O TRÁFICO DE SUBMARINOS AO SOL

Portugal, rosto da Europa que se fez ao mar com pouca gente e muita vontade de desbravar mundos, mandou degredados para Angola e escravos para o Brasil, onde ajudou a criação de um esplendoroso país, apesar das suas assimetrias e a deslocação temporária da corte para lá, abarrotando os barcos de quinquilharias, brasões e muitos condes. Por lá edificou o milagre de Manaus, ópera, simulação cosmopolita, intrigas gostosas, enquanto pela selva os sequestrados da borracha produziam riqueza para os outros, entre as zonas do café, cacau, e outras riquezas fabulosas até ao petróleo de hoje e a violência e os sem-terra e as favelas impenetráveis.
Por cá tudo foi definhando, mesmo durante a dura vigilância do regime de Salazar e os tarrafais todos, diversos, implantados longe e perto, bem disfarçados pelo império inteiro. Cristine Garnier falou com legendagem desse homem que um dia foi traído por Deus e caíu de uma cadeira. Estávamos em guerra, catorze anos em três frentes, com todos os orçamentos possíveis e fértil terreno para traficar benefícios, entre construções logísticas, ementas erradas e ferros e géneros comprados com luvas.
Hoje, em plena crise económica e financeira, face dilacerada de um capitalismo global que quer crescer até rebentar, e já rebenta e já encalha em dólares e euros, incapaz de pensar o planeta e os erros da obesidade da teoria e da prática, destruidora, que abrirá em breve os braços a milhões e milhões de formigueiros imparáveis, da China, da Índia, da Ásia em geral. A Europa, entretanto, sobrevive numa lógica de mercado e de colagem de países entre si, pequenos e pobres, grandes e ricos, sob a orientação de tratados que não unem coisa nenhuma nem apontam para um verdadeiro espaço de coesão, de respeito mútuo, de partilha devidamente regulada. Aquilo a que se chama União Europeia é o que resta da civilização ocidental, de muitas mordomias e serviços sociais apreciáveis, entre profundas rupturas da colonização mercantilista americana.
Portugal, que olha cegamente para a sua enorme zona marítima, onde se podem engendrar riquezas enormes, de sobrevivência digna, deixou que lhe roubassem normativamente a sua frota pesqueira e da marinnha mercante, icluindo a rectaguarda dos grandes estaleiros. Passara o 25 de Abril e os três DDD, houvera muita desarrumação e algumas conquistas, aproximámo-nos da democracia. Mas acabavam indústrias, reajustavam-se poderes, os partidos políticos competiam, em fé e batota de meios, como os clubes de futebol.
Caíram as torres gémeas, na América, aviso dantesco do que pode aproximar-se dos nossos egoismos e dos nossos devaneios bem pensantes. A própria América sentiu o abalo e apanhou uma virose de corrupção que fez entrar em falência um grande banco, a crise alastrando como a peste, um vento devastador chegando à velha e senhorial Europa. Portugal andava enredado em monstruosas intrigas, lutas de alecrim e manjerona, aumento da corrupção, luta pelo poder, comissões de inquérito para tudo e para nada, castrando a actividade do governo relativamente a todas as coisas decisivas e às outras, as de campanário, por causa de mentiras, de luvas encobertas, de amigos indevidos do primeiro ministro, derrocadas sobre derrocadas, esforços ignorados pela comunicação social, papel a sobreviver sobre um mar de boatos. E por fim, quando abrandava o fluxo criativo das atoardas e dos barões falantes, era preciso descobrir mais cobre para transmitir novas descodificações. E aí estão os submarinos encomendados por Paulo Portas, que acreditou na argumentação dos militares, e nas irregularidades, nos tráficos de influência, milhões de euros de luvas, mais do que ganham (por nada) os nossos governadores de
geraçlão espontânea. A Alemanha não brinca em serviço (viu-se desde há muito) e já prendeu alguns prevaricadores, tratando do resto, Portugal sacudido, não tanto pela verdade e pelo julgamento de vários crimes, antes debicando audições tontas, de costas voltadas para as verdadeiras necessidades de cooperação, deslizando para o fundo do mar: Paulo Portas vai lembrar-se das «investigações» do Indepentente e outra gente combinará a aceder aos paraísos do dinheiro, até porque, um dia, esta terra crestada acarinhará os submarinos sem gasóleo. Restará um moinho de vento, comprado na candonga, para alumiar os sobreviventes.

fotos da imprensa, Expresso

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