Portugal, rosto da Europa que se fez ao mar com pouca gente e muita vontade de desbravar mundos, mandou degredados para Angola e escravos para o Brasil, onde ajudou a criação de um esplendoroso país, apesar das suas assimetrias e a deslocação temporária da corte para lá, abarrotando os barcos de quinquilharias, brasões e muitos condes. Por lá edificou o milagre de Manaus, ópera, simulação cosmopolita, intrigas gostosas, enquanto pela selva os sequestrados da borracha produziam riqueza para os outros, entre as zonas do café, cacau, e outras riquezas fabulosas até ao petróleo de hoje e a violência e os sem-terra e as favelas impenetráveis.
Por cá tudo foi definhando, mesmo durante a dura vigilância do regime de Salazar e os tarrafais todos, diversos, implantados longe e perto, bem disfarçados pelo império inteiro. Cristine Garnier falou com legendagem desse homem que um dia foi traído por Deus e caíu de uma cadeira. Estávamos em guerra, catorze anos em três frentes, com todos os orçamentos possíveis e fértil terreno para traficar benefícios, entre construções logísticas, ementas erradas e ferros e géneros comprados com luvas.
Hoje, em plena crise económica e financeira, face dilacerada de um capitalismo global que quer crescer até rebentar, e já rebenta e já encalha em dólares e euros, incapaz de pensar o planeta e os erros da obesidade da teoria e da prática, destruidora, que abrirá em breve os braços a milhões e milhões de formigueiros imparáveis, da China, da Índia, da Ásia em geral. A Europa, entretanto, sobrevive numa lógica de mercado e de colagem de países entre si, pequenos e pobres, grandes e ricos, sob a orientação de tratados que não unem coisa nenhuma nem apontam para um verdadeiro espaço de coesão, de respeito mútuo, de partilha devidamente regulada. Aquilo a que se chama União Europeia é o que resta da civilização ocidental, de muitas mordomias e serviços sociais apreciáveis, entre profundas rupturas da colonização mercantilista americana.
Portugal, que olha cegamente para a sua enorme zona marítima, onde se podem engendrar riquezas enormes, de sobrevivência digna, deixou que lhe roubassem normativamente a sua frota pesqueira e da marinnha mercante, icluindo a rectaguarda dos grandes estaleiros. Passara o 25 de Abril e os três DDD, houvera muita desarrumação e algumas conquistas, aproximámo-nos da democracia. Mas acabavam indústrias, reajustavam-se poderes, os partidos políticos competiam, em fé e batota de meios, como os clubes de futebol.
Caíram as torres gémeas, na América, aviso dantesco do que pode aproximar-se dos nossos egoismos e dos nossos devaneios bem pensantes. A própria América sentiu o abalo e apanhou uma virose de corrupção que fez entrar em falência um grande banco, a crise alastrando como a peste, um vento devastador chegando à velha e senhorial Europa. Portugal andava enredado em monstruosas intrigas, lutas de alecrim e manjerona, aumento da corrupção, luta pelo poder, comissões de inquérito para tudo e para nada, castrando a actividade do governo relativamente a todas as coisas decisivas e às outras, as de campanário, por causa de mentiras, de luvas encobertas, de amigos indevidos do primeiro ministro, derrocadas sobre derrocadas, esforços ignorados pela comunicação social, papel a sobreviver sobre um mar de boatos. E por fim, quando abrandava o fluxo criativo das atoardas e dos barões falantes, era preciso descobrir mais cobre para transmitir novas descodificações. E aí estão os submarinos encomendados por Paulo Portas, que acreditou na argumentação dos militares, e nas irregularidades, nos tráficos de influência, milhões de euros de luvas, mais do que ganham (por nada) os nossos governadores de
geraçlão espontânea. A Alemanha não brinca em serviço (viu-se desde há muito) e já prendeu alguns prevaricadores, tratando do resto, Portugal sacudido, não tanto pela verdade e pelo julgamento de vários crimes, antes debicando audições tontas, de costas voltadas para as verdadeiras necessidades de cooperação, deslizando para o fundo do mar: Paulo Portas vai lembrar-se das «investigações» do Indepentente e outra gente combinará a aceder aos paraísos do dinheiro, até porque, um dia, esta terra crestada acarinhará os submarinos sem gasóleo. Restará um moinho de vento, comprado na candonga, para alumiar os sobreviventes.
fotos da imprensa, Expresso
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1 comentário:
Apesar das consequências flagrantes dos erros cometidos, o deus dinheiro continua a comandar o século XXI.
Não parece haver saída confortável.
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