quinta-feira, outubro 22, 2015

MAIORIAS ESTÁVEIS NO LIMITE DA COSTA FALÉSIA


Acabou um ciclo, dizem; temos de voltar e escolher as novas luminárias do novo ciclo. Em boa verdade, o país, Portugla do nosso esquecimento, está em vias de ficar mais deserto no interior, afundando o Algarve em mais betão, mais passeantes vindos de toda a Europa, Américas, Médio Oriente, Índia, China, Eritreia.

Neste mesmo Outubro de 2015, os portugueses foram chamados às urnas (não estou a falar dessas nem a chorar o 1º de Novembro). Acabou o tempo do governo de Passos Coelho e foram escaladas as eleições nacionais: gastando um tempo imenso e mal temperado de estudos, mensagens políticas, sessões de debate sereno, voltou tudo ao mesmo: o governo  de Passos, A COLIGAÇÃO, que é uma forma um pouco secreta de diluir os dois partidos implicados, não engraçou muito com demasiada exposição, descansou, planeou e tratou de algumas armadilhas, ficou a ver os austerizados passando e só se atirou ao lobo nos escassos e mal organizados debates desta fase. Deu tudo mal para aqueles que se julgavam na frente da maratona, sobretudo o partido Socialista. Com tanta fome de verdadeiro poder, os socialistas andaram em sondagens de ouro, a par do  silêncio bondoso dos coligacionistas. Chegou, enfim, a hora das arruadas das quais Passos se defendeu bem, conciliando o seu discurso de «palavras sobrepostas» com os lamentos dos pobres e algumas palavras soezes.


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E tudo acabou (para começar dias depois) com umas estranhas abadas de votos. Aqueles que já não vão em simbolismos radicais, indo votar branco, ficaram em casa e cacarejaram durante a noite do grande espectáculo, coisa que nem a Teresa Guilherme saberia gerir (o que não quer dizer que seja boa a sua gestão) nem a Cristina Ferreira gritaria melhor (o que não significa que essa apresentadora grite bem).



Os senhores da coligação, que passavam por ser os vencedores com maioria absoluta, perderam 700.000 votos (foi um modesto corte em nome da Troika) e tiveram de pousar na terra da maioria relativa. Os senhores socialistas, comandados pelo António Costa (que viera substituir democraticamente o jovem Seguro) não passaram dos 32% e perderam perante os coligados, que ficaram senhores de um osso relativizado mas razoável.
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Vieram os do Bloco de Esquerda, com as suas duas meninas Catarina e Mortágua, e fizeram-se ao bife: mais que duplicaram o seu eleitorado e como que piscaram o olho ao Costa, um caso (pensou ele) verdadeiramente histórico nestas quentes esquerdas. O BE arrecadou 19,9/% de votos. E o hirto Partido Comunista-PEV (uma outra coligaçãozita) incendiaram a memória de Jerónimo (chorando por Álvaro Cunhal) com a módica meia-tinta de 8,25 % de votação.
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Pensava eu, e outros como eu, que este resultado ainda segurava, por algum tempo, A COLIGAÇÃO PSD/CDS. Porque o partido mais votado apresentaria o seu líder ao presidente da República para que este o indigitasse à formação de governo. Situação frágil mas conhecida. O Passos foi à vida sem ser indigitado mas com o recado de estudar a formação do governo. E pensou: o meu segundo cenário vai para o Costa, embora também esteja fraco.
Fraco? Já andava a namorar o Bloco de Esquerda, para formar uma nova maioria à esquerdina, coisa que não houvera nestes cenários pós-25 de Abril. Namoraram duas vezes e foram visitar pela primeira vez a casa do Passos. Passos estava com a alma deslavada e atirou-lhes com vinte papelinhos integrando pontos para juntar aos do Costa. Ora o Costa estava mais interessado noutra vitalidade. E lá foi para enviar o roteiro geminável à coligação. Não deu em nada e o Passos cuspiu para a televisão que esta atitude não os levaria a nada e nem iria volta a reuniões com o PS. Recebeu o plano e escandalizou-se: «Isto é o programa de governo do PS, feito pelo Centeno». Acabou-se. E já o Costa vinha à televisão explicar a dinâmica mais mobilizadora do Bloco de Esquerda. Explicou os pontos acordados, contando também com a discreta presença do PC.
O locutor questionou: «Mas como é que o senhor resolve a posição desses partidos que não querem o euro, nem a Europa, nem a Nato, nem o Tratado Orçamental». Costa sorriu: «Tudo resolvido. Eles garantiram que nada reivindicam a esse respeito, guardam na gaveta, podemos confiar. Nem é o programa deles que funciona, é o nosso em justos acertos».
O entrevistador abriu muito os olhos e mandou o Costa para outra entrevista.
Cavaco sabe o que fazer porque (diz) montou quatro cenários. Um deles vai resultar. E ele pensa nos estranhos presidentes que o vêm substituir na contenda para a escolha (provável) de um idoso catedrático de direito, há mais de uma década comentador político de televisão.
Pedi ao Goucha para supervisionar este texto. Disse-me, afunilando os dedos, falta um pouco mais de sal, senhor professor... Pensei que esta salada intriguista, sonsa, em que nada inspira confiança, talvez empurre mais emigrantes para as calendas, aumentando os abstencionistas para uma ordem de 100% e grandes bolsas geridas pela Santíssima Trindade de três troikas.


segunda-feira, outubro 12, 2015

COSTA PINHEIRO, FALECIDO ENTRE O EXÍLIO E A IMIGRAÇÃO



Eu gostava dele, mesmo sem ter a certeza de o conhecer e tendo trocado um monte de palavras com os seus óculos a brilhar. Depois disse-me que as pinturas chamadas de Reis eram a lembrança da nossa História e apareciam-lhe das cartas e dos livros e dos sonhos de criança. «Não, não sou nem um imigrado nem um artista votado ao exílio. Os que emigram procuram empregos, cidades e escritórios. Eu não tenho nada disso.» 
Andávamos por ali, ás voltas, na exposição do KWY, como no livro de Herbert o Hélder, aquele que se chama OS PASSOS EM VOLTA e é uma obra prima da literatura portuguesa.

Costa Pinheiro morreu em Munique, com 83 anos. Aqui mesmo dois quadros dele dedicados a Fernando Pessoa, génio incontestável. Lembro-me do que ele disse nessa linha de desocultações: «A imaginação domina o corpo. E o corpo vive equilibrado com as emoções e os sentimentos naturais.» Fernando Pessoa podia ter dito algo assim, no seu «Livro do Desassossego».



A frase-lema de Costa Pinheiro: A imaginação é a nossa liberdade.

terça-feira, outubro 06, 2015

A MULHER QUE NOS OLHA DE FRENTE E VÊ: futebol, miudezas da fé, televisão de novelas e publicidade, política atrapalhada, a morte em casa e o império perdido

*Há vários anos que me sinto enganado no curso anunciado da nossa verdadeira história, porque nos tolhem os passos, dos anteriores até aos posteriores, e tão lento me fazem ser que só me restam imagens abaixo desta, deusa do Loge.*
Vou ao sabor do que me ocorre. 
Começo pelo passado dia 4 de Outubro, domingo, 2015: foi dia de eleições legislativas,Portugal, depois de sondagens favoráveis à coligação PSD/CDS, que governou o país sob um horrível clima de compressão, entre cortes impiedosos nos vencimentos e nas pensões, altos níveis, vagas de emigração, altas percentagens de desemprego, vagas de emigração, mitos da utopia europeia sob o rigor assimétrico da Alemanha, miséria, suicídios, greves, sobras de riqueza entre aqueles que nunca se mostram como podem ganhar 100.000 euros por mês no mesmo país onde o ordenado mínimo pouco passa dos 500 euros.
Não vou contar a miséria da queda do Império, do tempo da ditadura, dos "retornados" de África, feridos ainda hoje sem o devido ressarcimento, populações a quem tudo foi roubado, empurradas para a Metrópole através de uma ponte aérea e à mercê de hotéis, pensões, albergues, casas de família. Dizem-me ao ouvido que Portugal conseguiu um feito notável ao resgatar cerca 

                                      

750.000 cidadãos, integrando-os em  pouco tempo. Quem  me  sopra  assim  ao  ouvido é um velho amigo daquele almirante careca que desarmou toda a gente, baralhou  as  forças  armadas  já desautorizadas, trabalhou a favor de um Movi- mento que tinha a benção de Leste  mas  deveria,  em vez de arrebatar de forma totalitária  o poder, teria  sido  melhor que o  partilhasse com os outros. Falo de Angola,  onde  os  próprios  cubanos  abancaram  para  ajudar o  governo  pouco sabido  em  guerra  guerrilheira  e tinha já  os  sul-africanos  subindo  pelo terri-tório. Os cubanos   combateram,  empurraram a malta do sul e ficaram também à espera de retornar a Cuba, tratando de se pagar  com  carros, carrões  e  carri- nhos, ou fábricas quase inteiras. Vieram sem custos. Depois daquele tempo,  al- guma  oferenda  haviam  de  receber "Retornaram"  a  Portugal,   estiveram   em hotéis  pensões,  tiveram   subsídios  e receberam a boa televisão metropolitana e a política  gritada, com  arruadas, sem faltar a direita e a esquerda.

Mas não é bem disto que me apetecia escrever algumas notas:
Das eleições ocorridas no domingo, a coligação que estava no governo voltou a ganhar a maioria (por absurdo que pareça). O PS, que andou sempre mozambúzio, enleado num secretário geral muito jovem e sem verdadeiras ideias de projecto, José Seguro, acabou por se fracturar numa complexa luta por aquele lugar, António Costa contra Seguro. Perdeu Seguro mas as tendências internas do partido misturaram caldeiradas requentadas e foram para as eleições com um bom método de Costa mas ainda sem capacidade interventiva e científica. A coligação não tinha senão as ideias da espinha do peixe, o programa era esse, chupar a espinha, em perfeita estabilidade, até porque havia dinheiro emprestado pelos mercados (mais dívida) e um cus-cus de vapor económico, embora houvesse acabado a troika. Enquanto a Europa se fechava na fascinação da ordem, da regra, do poder da Alemanha, na mania dos gregos em terem ainda o seu Olimpo, o direito a escolhas, coisas menores que lhe valeram uma enorme malhada humilhante na reunião com uma espécie de mutantes da grandeza e da escassez azeda.
Ontem à noite, os canais de televisão, embora sem prescindir do futebol e dos respectivos marretas, debateram os resultados e voltaram aos dados constitucionais, chegando a propor que se escolhesse a maioria pelo aumento de votos à esquerda (mas não de deputados), ao contrário da geografia matemática que mandavam as regras e o bom senso. O PS não é da mesma esquerda que o Bloco de Esquerda e amanhã talvez apresente um papel de serviço. Senhores do Olimpo, que futuro há para nós nesta tormenta de gente insana ou neste pánico quase suicida?



                                              Mortágua em nome do BE+PS

 As diferenças são tão notórias que é impensável advogar aquela linha para essa duas áreas. Nem com o resto. E a balbúrdia instalou-se, amainou hoje, mas os resultados vão encalhar em várias assembleias de guerrilha, porventura com mais eleições a meio da legislatura. Se então reaparecer a troika, sairão do país mais 500.000 jovens sequiosos por mais dinheiro, menos campo e mais mitologia urbana , tropeçando em euros.
Devem ter todos cuidado com os refugiados, não porque eles sejam feras, mas porque são nações, por vezes pequenas nações, adoçadas o melhor possível à nossa cultura e antiga história. A Alemanha tem a RDA vazia, onde pode criar um novo mundo de mesclas, mas vai regando a terra seca da perdida solidariedade europeia e finge desconhecer que as cheias e as intempéries têm agora uma escala avassaladora, anunciando que os continentes de grandes dimensões têm afinal potencialidades para revitalizações enormes e nunca um destino de infinitos  esvaziamentos..





Portugal não é a formiga pig que anunciam os lordes do norte, e outros mais ou menos. Portugal é um país que desbravou muito mar e abriu terras ao futuro, deixando por lá marcas e gente de assinalável sentido da aventura, da busca e das trocas comerciais. Da lonjura da Ásia às pontas do Brasil, da África ocidental e oriental até à Índia, o nosso sangue e o nosso engenho ainda sobram enquanto memória e nações. O oceano rodeia toda a nossa fronteira virada a oeste e dispomos de uma área marítima (que muitos nos querem retalhar) capaz de ainda ter petróleo e que alberga, de certeza, vastos campos de investigação geológica, biológica, entre o que se desconhece nas grandes profundidades; pode assim ajudar-se a salvar quem é, incluindo a deter a degradação do planeta como o homem tem vindo gananciosamente a fazer, queimando o ar e alguns apenas pensam o país como a verdadeira"jangada de pedra" que Saramago inventou, impossivelmente eterna e imperdível.
A humanidade tem ensandecido cada vez mais, deixando-se arrastar pela invenção tecnológica e, com ela, empolar os efeitos colaterais, maléficos, da globalização.

Mas falando de coisas caseiras e quase inenarráveis:
1. Um canal português de televisão produziu, entre muitas outras, uma novela intitulada MULHERES. Era um trabalho bem feito, um pouco amassado nas repetições formais e de mobilidade. Tratava o problema da vida de vários casais e pessoas, no âmbito profissional do imobiliário, duas empresas, uma de mulheres a libertar-se do baixo jogo comercial. Curiosamente, entre os primeiros episódios, as actrizes faziam um depoimento sobre o sentido da sua entrega e qual o seu projecto de vida. Isso foi depressa abandonado. Os casos eram interessantes e rodados com simplicidade, a despeito dos problemas humanos e sociais que emergiam em certa progressividade.



Ora esta curiosa novela passou para o fundo da noite e depois, embora fosse quadricularmente bem organizada, a televisão produtora resolveu desligar tudo para a ponta da semana: ou ao sábado ou ao domingo, recordando planos anteriores obsessivamente antes do tardio genérico, aliás com publicidade no declínio mal «avisado» do retalho breve da semana. Estes abusos (do seu próprio trabalho e dos actores) são cada vez mais frequentes na televisão portuguesa, para a qual parece que ninguém aponta a necessidade de lhe restituir verdadeiros planos deontológicos e a devida legislação formal ou punitiva.
Faz rir, no entanto, saber-se hoje que a Instituição que trata da atribuição dos prémios Emy nomeou as nossas pobres MULHERES para a hipótese de receberem um daqueles galardões.

2. Este caso fez-me estudar problemas paralelos: e são brutalidades contra o bem estar e a boa comunicação de entretenimento (já que não passam disso).
Um outro canal da nossa prolixa televisão, começou por somar telenovelas em horas depois dos noticiários  da noite. Por último, a par de outras novelas de outros canais, tudo por cima de tudo -- e tudo encravado ao "segundo" por cortes gerais de publicidade -- o canal a que nos referimos já acumula cinco capítulos até cerca da uma hora da manhã, uns cortados ao meio, outros colados aos seguintes, chegando mesmo a apresentar no fim a notável novela IMPÉRIO, cortada num pequeno revisionamento e em mais duas metadinhas atravessadas pela famosa publicidade que concorre, assim proposta, para delitos domésticos de faca e alguidar. Dada a impressão em que os próprios intervenientes se embrulham na sequência programática cada vez mais, até  a actual REGRA DO JOGO (brasileira), sendo um objecto assinalável, acaba estropiada na malandragem em grande gritaria e com tanta gente em campo (por vezes) que apetece encurtar  com um  breve perfume Done contra seu próprio modo de ser.



Noutros campos, o futebol é um dos maiores factores de doença colectiva que alastra pelas televisões. E não me refiro apenas aos jogos, esses mesmos cada vez mais rebenta pedras e menos bamboleia, tudo brutal e custando milhões.  A indústria de homens para a bola chega a ser chocante nas assimetrias e no horror das maningâncias de dinheiro, honorários e muitas outras despesas.
Algo de semelhante, mais sofisticado, pago de fora, acontece com as indústrias da comunicação audo-visual ou só de som (se fosse possível refrear a montagem de «utilidades» no mesmo objecto de consumo). As redes sociais corrompem a natureza humana (quanto mais se sabe mais se insiste) e os processos comunicacionais queimam consciências, limitam os tempos de lazer ou trabalho. Cada rapariguinha, cada rapaz, além dos homúnculos a deslizar ecrãs e senhoras castigando teclas com a ponta dos dedos, têm várias máquinas como ardósias a seu lado, no banco do jardim. Enquanto dedilham uma, as outras esperam. Serão os amanhãs que cantam?

Só sobre o nosso dia a dia, na cidade, sobram casas, taxas, impostos, erros de construção e fios acumulados sobre as portas por causa das zonas e dos meos, sabe-se lá que mais entre tubos da água com cem anos, que se rompem, e esgotos incapazes de susterem as cheias vasculares, inundando de fezes e água barrenta as belezas da Avenida da Liberdade, do Marquês de cima abaixo, não é?



Lisboa nunca será assim, felizmente