sexta-feira, setembro 09, 2011

UM BELO CINEMA PORTUGUÊS CEGAMENTE BANIDO

Cisne, filme de TeresaVillaverde
Belíssimo desempenho de Beatriz Batarda

Desde 2006 que Teresa Villaverde não filmava uma longa metragem. Desde «Transe». Agora aparece «Cisne», uma obra em que Beatriz Batarda interpreta a personagem de uma cantora em crise íntima. Menos «pesado» do que em peças anteriores, sobretudo «Mutantes», Teresa conseguiu gerir por completo as vertentes de uma realização deste género: o filme passou na terça-feira, dia 6, no Festival de Veneza, na secção paralela Horizontes, e, surpreendentemente, estreia-se já, hoje, quinta-feira, em Portugal. Esse «fenómeno» sopra nos distribuidores, nos intermediários, em todos os contactos, por vezes obscuros, que as próprias artes, todas, carregam sobre as costas. Teresa lembrou-me a minha própria aventura, quando fiz filmes que só vieram a lume nos circuitos universitários, não tendo nunca, em volta, um simples aceno de alguém que os achasse transferíveis para nova realização profissional, pronta a aceder aos circuitos profissionais. Nunca soube os naipes das cartas nos secretos jogos de fascínio e influência do nosso liliputiano meio financeiro, das alavancas culturalmente capazes de abrir espaços, entre a criação e vários planos de oportunidade. Digo isto a propósito de obrazinhas que fiz em solidão, desde a produção, o financiamento, os actores, a escrita do roteiro, as filmagens, divindindo-me em fotógrafo e realizador, depois em editor, em curiosos zelos de montagem e finalização, ou seja: trabalhava como director executivo do som e das bandas musicais.
Não estou a fazer o meu auto-elogio, embora pareça. Estou a rever fascinações que me são agora,
a um nível de outro peso, por Teresa Villaverde: ela fez tudo do princípio ao fim, imaginando esta bela viagem, assumindo-se realizadora e câmara, a par do trabalho de edição e do som, incluindo, por fim, distribuir a obra (três cópias apenas), tanto em Veneza como em Lisboa. No plano a que ela trabalhou, superando a crise, merece que a olhe mos com atenção e na bofetada enluvada que foi espalhando pelos perfumadas instituições, Estado, Lobys, Figuras do dinheiro e do tráfico destas mercadorias -- um horror que emigra das grandes capitais e manipula o público português, aquele que se deixou cair no lado rasca da cultura e que ainda se dá ao luxo de misturar o colonialismo guerreiro, monopólios, com as serenas reflexões sobre a condição humana e os erros do árbito.
O cinema de Teresa Villaverde sempre de configurou numa aproximação dramática, senão mesmo trágica das vidas no limite. Mas, neste seu último filme, uma certa pacificação abrange a teia de conflitos existenciais em torno da personagem central. Não sabendo explicar muito bem porquê, a autora chama a atenção para questões relativas aos níveis etários em filmes como «Os Mutantes» e o actual. No anterior, as figuras de crianças ou gente de uma puberdade ferida, eram confrontadas com a fealdade do contexto, a degradação dos dias e dos lugares. Em «O Cisne», sem que a base do humano passe pela inspiração de alguém, a realizadora lida com pessoas mais velhas, o que tende a um caminho mais reflectido ou a lutas interiores mais controladas. Vera, assumida por Beatriz Batarda, é desde o início uma cantora. Tal facto não aparece cristalino, mas a verdade é que ela escreve as suas canções, Villaverde vive a sua vida, a suas inquietações. Quando Vera está no palco, Beatriz dirige o que há para dirigir, gera uma fonte de angústia.
No «Cisne», diz-nos Teresa numa entrevista que deu ao Diário de Notícias, o meu entendimento com Beatriz foi enorme, muito profundo e construtivo. Ela trouxe muita coisa ao filme, uma energia muito dela, e tornou possível uma calma que me permitiu escrever durante a rodagem, refazer materiais, mudar diálogos.
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Estas breves impressões baseiam-se, em parte, na entrevista referida, com Eurico de Barros.

1 comentário:

jawaa disse...

Nem só em Portugal, possivelmente, mas aqui é notória a profunda injustiça em relação às boas produções de arte, a todos os níveis. E o que é pior é que, quando há reconhecimento de algum valor português, esse reconhecimento vem sempre de fora e, seja uma banda musical ou uma marca de sapatos, se brilha, é porque vem mascarado «de estrangeiro».
Para quando olhar de frente e dizer que somos quem/o que/como somos e temos muita honra nisso?
E depois, os escaninhos da glória
são como as contas dos bancos suiços.