UM LIVRO
SEM CÓDIGOS,
NEM DEUS,
NEM DA VINCI,
PELO QUAL SANTANA
SE EXPLICA
E RECONSAGRA
Santana Lopes, após um tempo de oficina e a habitual travessia do deserto, apresentou um livro - Percepções e Realidade - em que procura «branquear» o período agitado do seu governo, substituindo Durão Barroso, cujo natural salivar o atraíra para a presidência da Comissão Europeia. Ouvi ontem a entrevista de Santana à Judite de Sousa, ritual que esta mantém com apreciável profissionalismo, e verifiquei mais uma vez a ductilidade representativa daquele político: as palavras escorriam-lhe da boca e procurava não dar espaço à entrevistadora, apesar de alguns entrechoques sem duração e valor. Ele falava com uma «bondade» explícita, parecendo contrariar muitos pontos de leitura que Judite de Sousa teria encontrado no livro, entretanto sem reflexo no discurso televisivo que Santana lhe debitava.Há qualquer coisa em Santana Lopes, penso eu, que lhe trava, desvia ou adoça as qualidades de político. Claro que ele conserva uma formação mediática que vem de longe: basta ver o que aconteceu agora (e ele quase se limitou a reaparecer) com a roda vivia em torno do livro, a rápida convocatória para uma entrevista de primeiro plano, em prime time, e a concentração de comentadores nos jornais e nas rádios. E será esta figura, feita nas bancas do pós 25 de Abril, na deriva partidária, no rápido acesso a importantes personalidades, nos corredores e mentideros da Assembleia da República, tão decisiva e gigantesca assim? Servirá o livro apenas (ou sobretudo) para que a sua memória futura, entre a família e os estudiosos isentos, fique transparente, pronta a iluminar a cabeça dos filhos e futuros netos?
Vejamos alguns excertos dos comentários jornalísticos em cima do acontecimento consagrado pelo livro e os dedinhos do autor já dedilhando o futuro (que para ele é o passado). A selecção seginte baseia-se numa outra, a partir da Quadratura do Círculo,
por Francisco Sena Santos, «Diário de Notícias» 16.11.2006:
O centro do livro é uma tese conspirativa: a de que tudo o que aconteceu a Pedro Santana Lopes deve-se à actuação de três pessoas que actuaram concertadamente com o objectivo de derrubar o Governo, afastar PSL da vida política e criar condições para o que temos hoje, Cavaco Silva em Belém e José Sócrates em S.Bento. Essas três pessoas são Cavaco Silva, Marcelo Rebelo de Sousa e Jorge Sampaio (junta-lhes Carmona Rodrigues. É uma tese conspirativa sem fundamento e o que escreve nada acrescenta. (Pacheco Pereira)
O livro de Santana Lopes aviva-nos a memória para um facto indesmentível, o de que todos os que agora, dentro do PSD, diaolizam os erros e desgraças trazidas PSL, naquele tempo eram (com a rara excepção de Pacheco Pereira) seus apoiantes e muitos foram por ele nomeados. (Jorge Coelho)
Durante a entrevista, Santa Lopes, demarcou-se de tudo o que se dissera durante a tarde - a clara dedução de que Durão Barroso preparara a sua saída antecipadamente e pressionou Santana no sentido de o substituir. Lobo Xavier, no programa acima referido, também se referiu a isso: O que Santana Lopes conta sobre Durão Barroso é algo que hoje já não é novidade. Sabe-se que Durão Barroso, durante muito tempo, friamente, preparou a saída do Governo para saltar para a Comissão Europeia.
O falhado governo de Santana, e as convulsões assíduas que nele eclodiam e não valiam nada, tudo isso vai sendo esbatido. A entrevista de ontem, em que o livro não é analisada nem posto em causa, nem no menor capricho, será a porta luminosa capaz de contribuir para os não muito distantes reaparecimentos políticos de Santana, ancorado nos portos de ocasião mais favoráveis. É verdade que não falava muito quando aparecia a debater futebol na televisão. Mas nos Congressos e outras ocasiões propícias, o amante da política voltará a desconfirmar, como acabou por fazer ontem, que nunca mais dirá nunca.
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