quarta-feira, março 16, 2011

O HORROR CÓSMICO E O SUAVE PERDÃO A DEUS


Esta é uma imagem recente da grande tragédia que se abateu sobre o Japão, um terramoto seguido de um colossal tsunami e um conjunto de efeitos secundários que colocam o país em risco nuclear, sem tornar visível as cidades que desapareceram, a devastação sem nome, entre colapsos urbanos, rodoviários e outros, além de mais de dez mil mortos. O que se passou no Japão, em pouco tempo, até nos faz desfocar o horror, então «expertimental», do primeiro lançamento das bombas atómicas sobre Hiroshima e Nagasaki. É verdade que muitos erros foram cometidos no Japão, apesar do seu enorme avanço tecnológico, e já na sua reconstrução avançada ainda se escolheram zonas de falhas sísmicas para implantar centrais nucleares. A grande quantidade de energia nuclear de que o Japão dispõe não passa, contudo, de 20% do total de que necessita. Se Hiroshima pode ser considerada como uma estratégia de guerra, e portanto como um erro humano, a realidade actual (num universo que não percebemos o que seja nem se ele é regido de alguma forma) teria então de ser interpretada como um erro de Deus.
Com as seguintes imagens, procurei chamar a atenção para a notícia e para o absurdo dela, em extensão e non-sense: não tanto a brutalidade do tremor de terra e a devastação que durou cerca de cinco minutos, seguida nos dias seguintes por centenas de outras; não tanto a já habitual formação de tsunamis com ondas de dez metros de altura e penetração de 12 quilómetros pelo território cada vez mais desfeito; e nem sequer o que que acontece com as centrais nucleares cujo colapso relativo lançou para a atmosfera uma onda de gás radioactivo cujas consequências conhecidas promovem a evacuação de largas áreas habitadas e empurra os próprios japoneses a tentarem abandonar a sua terra, os seus haveres, procurando noutra parte do mundo uma eventual salvação.
Detalhe entre os detalhes: a beleza solitária de uma rapariga que chora entre os destroços e os planos sucessivos, até ao azul, de montes de ruínas, perdas de tudo e, em especial, de vidas humanas.
Ferreira Fernandes escreveu no «Diário de Notícias»: «Como é possível darmo-nos conta do que é um terramoto de grau 9, um tsunami de dez metros e explosões em três reactores nucleares, se quem os vive grita menos do que um repórter televisivo sobre as pedradas de camionistas na rotunda do Carregado?»


Esta vítima da tragédia que se abateu sobre o Japão, mais parece um anjo de asas decepadas e ainda capaz de olhar para o futuro através dos mortos e destroços em volta.
Ferreira Fernandes escreveu no «Diário de Notícias»: «No Japão, um pai agradece o telefone da SIC, emprestado para avisar o filho, na América, de que está vivo. À volta é um mar de lama que pousou sobre a sua cidade e a calou (arrasou, diria eu, se essa mesma palavra não fosse usada nos jornais portugueses de cada vez que Pinto da Costa fala de um árbitro).»
E com esse cenário de fogo, de água e de ar apocalípticos, o japonês disse ao filho que nem tudo eram tristezas.
Poderemos nós, agora, enquanto arriscamos o país a cair numa tragédia gerada pelas mãos humanas e por atritos infinitamente escassos, dizer que a esperança cabe em dez dias e que, se iniciámos a construção do TGV em plena crise finaceira, isso é infinitamente menos do que pretendem fazer os japoneses: reconstruir para o ano a cidade de Sendai.

2 comentários:

Miguel Baganha disse...

Na rubrica "No Comment" não há palavras, apenas imagens: nós é que pensamos as palavras.
Aqui, apesar da habitual eloquência do artigo, as imagens valem mais que mil palavras.

...No Comment...

jawaa disse...

As suas palavras a relembrar uma tragédia sem tamanho que toca a todos nós, terminam com um parágrafo de sabedoria mesclada de esperança.
Nada é impossível se os homens quiserem de verdade.
Basta querer.