sexta-feira, maio 02, 2014

RUI MÁRIO: MORREU UM PENSADOR DAS ARTES


RUI MÁRIO

Quando me contaram não me ocorreu o que deveria dizer. Morrem os amigos e os que pensam sobre coisas que também nos movem. Um aneurisma, um assalto sem honra nem limite. Conheci Rui Mário na altura em que tinha já alguns anos de docência na antiga Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. E na SNBA. E na AICA. Escrevi nos mesmos jornais e revistas onde ele se exprimia como crítico de arte. Discutimos o fim e o princípio das artes, a escrita, a pedagogia neste âmbito. E um dia ele escreveu o único verdadeiro ensaio que alguém escreveu sobre a minha obra, no catálogo de uma exposição na Judite daCruz. Um dia, na Bucchholz, que ele então dirigia, tocou-me no braço, parou, olhou-me com grande precisão e disse-me: «Você tem ali um grande livro». Eu voltara de Angola e escrevi vinte anos depois um livro sobre a guerra em que participara. Era sobre esse livro que ele me falava. Era ao mesmo tempo sério e divertido, discutindo sobre arte com os dois tons no mesmo tom. Tinha o sentido da luta mas não da violência. E habitava as crenças maiores do século XX quanto à arte moderna.
Irmão de Eurico Gonçalves, outro grande amigo, licenciado em Ciências Físico-Químicas mas interessado desde muito cedo pelas artes plásticas. Dedicou-se à crítica de arte e desenvolveu, como professor de Estética, muitas iniciativas entre estudantes. Recebeu o Prémio Gulbenkian de Crítica de Arte, tendo colaborado nas melhores revistas nacionais, além de jornais. Leccionou também no Curso de Formação Artística da SNBA e trabalhou para a televisão e sobretudo na RDP (Antena 2). Foi membro da Sociedade de Gravura e do respectivo Conselho Técnico.
Das suas obras, podemos destacar "Pintura e Escultura em Portugal" | "O Imaginário da Cidade de Lisboa, 85 | "Dez anos de Artes Plásticas" - 1974-84. O seu currículo ultrapassa o limite desta sombra, deste resumo como perfil e memória. Lembrando as figuras que Rui Mário mais estudou, elas surgirão na sua companhia, daqui a algum tempo, amanhã, depois, mãos dadas a Dacosta, Almada, Amadeo, Cruzeiro Seixas.

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