segunda-feira, setembro 07, 2009

MORREU JOÃO VIEIRA, FICA A SUA OBRA LETRISTA

João Vieira


Não há muito tempo que João Vieira me telefonou por causa de um texto meu, pedindo autorização para o publicar. Conversámos um pouco. Estava a trabalhar, era a sua voz e as suas letras emblematizando mensagens na tela, ou apenas formas, ou talvez nem isso, como diria Álvaro Lapa. Falámos devagar sobre a roda dos tempos. Eu sempre o tratei com deferência, com uma admiração disfarçada, talvez por sabê-lo mestre e isso me condicionasse numa espécie de pudor. Era respeito pela sua convicção nas coisas que produzia. Nunca esqueci a extraordinária encenação que ele fez, no Monumental, para a peça «Quem tem medo de Virginia Woolf?». Glória de Matos no seu melhor, Jacinto Ramos muito bem, embora sabendo que não podia competir com Richard Burton. E as instalações, e as coisas que João Vieira sabia inventar antes da hora em que eram expedidas do exterior. A instalação com letras de espuma, na Judite Dacruz, onde uma magnífica «desordeira» como Dorita Castelo Branco se entrelaçava, a significar gestos, ainda longe de saber o martírio que a esperava. Depois as letras boiantes no chão , nas quais as senhoras tropeçavam e tinham de descalçar os sapatos de salto alto. A desmistificação da pose era uma coisa grata a João Vieira, apesar do charme que sabia apontar aos cultos da bueruesia, no alto das escadas, nas aberturas dos salões, «mitologias de hoje», saudades de amanhã. Agora, que faleceu, pode olhar-nos assim, entre a melancolia do passado e a força de escritas que recuperava de um modo gráfico, sólido, sem drama mas com força para juizos de amanhã.

4 comentários:

Anónimo disse...

Pesa-me na consciência andar a visitar este (e não só este) blog de Rocha de Sousa, sem ter para com o autor e seus comentaristas uma palavra de apreço, de estímulo cultural e de solidariedade cívica.

De uma vez por todas fica aqui declarado, com a mais absoluta convicção, que encontro aqui nestes sítios e conteúdos respectivos um dos momentos mais valiosos de todo o meu passear pela internet. Não estou sempre de acordo com tudo, o que é perfeitamente natural.
Mas acho notável que, neste país de "professores-doutores" endeusados e podres de prestígio que se guardam no silêncio preguiçoso, este verdadeiro mestre do dizer e do fazer se arrisque a dizer aqui tanta coisa que muitos podem pensar, MAS NUNCA DIZEM.

Rocha de Sousa, com o riquíssimo sentimento da gravidade da vida e da seriedade das coisas que lhe é conhecido, permanece por esta forma disponível, alheio e activamente contrário àquela "morte na alma" que nos desprotege e deixa sós, rodeados de silêncio.

Tive o prazer de conhecer há anos o artista e "construPintor", em condições muito especiais para mim, e nunca mais estabeleci contacto.

Para já, fica publicada a minha declaração acima, para os devidos efeitos.
Para mais tarde, quem sabe, talvez uma outra forma qualquer de contacto possa surgir.

Saudações e votos de óptima saúde.

José Brito disse...

Prezado Prof. Rocha de Sousa,

Homens com as suas qualidades humanas e profissionais como o Prof., infelizmente, vão rareando. O seu apurado e isento sentido critico, sendo igualmente no meu modesto entendimento, um dos artistas mais esclarecidos e grandiosos deste período, permite-se estar atento a tudo aquilo que vai acontecendo à sua volta sem que se proteja dos detractores endeusados que nada fazem ou produzem.
Deste modo, subscrevo o referido texto e afirmo que, sempre que possível, viajo e me deleito nos seus conteúdos.
Tais palavras apenas espelham o justo e credor reconhecimento pelo seu trabalho.
Parabéns!

Unknown disse...

é bonito o que escreveu sobre o meu (não só meu, há mais filhos - nunca sei se dizer "meu" ou "nosso" :) ) pai.
Só hoje vi. Obrigado
joana

SANTA - BARBARA disse...

NO DIA 5 DE JANEIRO , FEZ 4 MESES QUE O JOÃO VIEIRA , TÃO GRANDE HOMEM E PINTOR , DESAPARECEU DE JUNTO DE NÓS.....eu era menina quando ele me ensinou : A PINTURA É POESIA E A POESIA É BELEZA FISICA...DITA A BRINCAR , O MAIS SÉRIAMENTE POSSIVÉL

ATÉ JÁ JOÃO VIEIRA...ENCONTRAR - NOS - EMOS ENTRE A TUA PINTURA LETRISTA

E QUANDO OLHO PARA O GRANDE PAINEL COM CARACTERES CHINESES , LEMBRO - ME DE TI A ESTUDAR ESSA ESTRANHA LINGUA , QUE PASSAS - TE A DOMINAR , TÃO BEM , PORQUE QUERIAS SABER O QUE ESCREVIIAS . NUNCA NADA FOI AO ACASO NA TUA VIDA.....