segunda-feira, abril 02, 2007

OS GLOBOS DE OURO E A SUAS OMISSÕES




Chegámos ao século XXI com uma avançada carga de tecnologia, nem sempre bem utilizada, e um óbvio déficit cultural, não tanto por falta de quantidade, mas claramente por falta de qualidade, escolhas precárias, redutoras, cada vez mais colonizadas (em termos globalizantes) pelo imediatismo, mercantilismo, numa indelével promiscuidade de géneros, grandiosidades dos espectáclos, cascatas de jóias e vestidos milionários, de estlistas snobs, que procuram a todo o transe a magreza de tudo, dos modelos, da criatividade, das pindéricas encenações com que se apresentam um pouco por toda a parte.
O dia 1 de Abril pareceu mesmo um dia das mentiras, sobretudo na SIC, com a sua gala de galardões, globos de ouro, numa retumbante boda aos pedintes de espírito, como decorre dos textros sagrados. Havia bolas de ouro, com um arremedo de esfera armilar, aos montes, perdulariamente, presunçosamente, numa edição muito mal apoiada pelos documentos indispensáveis de apresentação dos nomeados. A recolha desses elementos era pobre, destituída de tempo de leitura ou sem leitura, enquanto a régie se deliciava a passear pelo espectáculo da plateia, resmas de mulheres bonitas, artistas, intelectuais, génios ainda em idade menor, o sonho que deveria re-lembrar a necessidade de um esforço colectivo para nos lenvantarmos destes ridículos mimetismos, destas grandezas fátuas, desta mediocridade omissa, entre caricaturas da democracia.
Para simplificar, a Caras e a SIC, de novo reunidos, resolveram premiar mais uma vez personalidades «incontor-náveis» do teatro, cinema, moda, toda a música, entre bandas e solistas que nunca se ouvem sob o assombroso troar das barerias electrónicas, entre dezenas de milhares de wats. Eles foram o melhor actor, a melhor actriz, tanto em cinema como no teatro ou televisão, o melhor humorista, a melhor causa huanitária, a maior personalidade -- e falta-me o fôlego para fazer mais nomeações. Não se falou de cenografia (teatro e cinema), não se indicou a notoriedade de algum cientista (que os há), esqueceram outras artes e autores que a televisão deveria inter-relacionar (artistas plásticos, intérpretes em vários instumentos de música erdudita, inventores (que os temas a sério), casos raros no domínio da literatura (de que até temos um nobel), da poesia (que nos caracteriza bem), de outros mais espaços assim, incluindo as editoras que também pecam por falta de prospecção e devem abertura a autores que se deixam adormecer na sombra das gavetas. Os homens do pensamento, os intérpretes de imagens (incluindo os fotógrafos que também faltaram), todo esse mundo que não chega aos tablóides ficou no casinha do isolamento e da omissão. Mas, apara além de se alargarem a toda a espectacularidade que campeia por aí, e tudo o mais que se sintetizou atrás, estas empresas da «comunicação» ainda inventaram ostensivamente mais um campo nomeável e premiável por tão preciosa democracia de votantes ad-hoc: o melhor beijo. E lá apareceram os vários beijos nomeados e o premiado foi o mais desconfortável, trocado pelos principais protagonistas da Floribela sob uma chuvada quase tropical.
Houve mais coisas, com certeza, de que já nem me dou conta, mas o que aí fica demonstra bem a indigência do poder destas instituições, a ignorância e mau gosto que propagam, o desentendimento das coisas que podem caber dignamente num orgão de televisão, que não se dedica exclusivamente ao espectáculo, concursos, musiquinhas e shows até à sufocação. Não é por acaso, embora com muita exiguidade, que lé se fala de literatura, de artes visuais, de arquitectura. O Siza Vieira não serve apenas para noticiar, após um prémio, em 30 segundos do telejornal. O recente prémio atribuído a Lobo Antunes poderia ter tido um adoçante globo. Houve por aí muito mais sucesso autêntico e nobre do que todas inundação do 1º de Abril na SIC. O que pareceu ter acontecido naquele Organismo terá sido a tradicional mentira daquele dia?

1 comentário:

Maria disse...

Às vezes perdemos tempo com coisas sem importância nenhuma...
O que é facto é que esta análise, correctíssima, se refere a um programa de tv que prendeu muitos milhares de portugueses aos écrãs, vá-se lá saber porquê...
À mesma hora, quais eram as alternativas dos outros canais, exceptuando a dois, que quase ninguém vê?

Boa noite, boa Páscoa