Portrait with Mun and Dad 2007
Na sua última exposição Sara Maia utilizava em título «O Sono do Cão». Em inglês, esta expressão idiomática - Dog's Sleep - significa um certo teatro, mise en scéne. Assim se esplica, com outras frases idiomáticas visuais, a série de sinpopses que a autora propõe no catálogo para cada quadro, uma espécie de roteiro, «uma representação das representações esperadas». Afinal, diz a pintora na mesma abertura: «O título 'O Sono do Cão' expressa ainda o facto de os cães dormirem em vigília, num permanente estado de alerta. Pela sua sensibilidade apurada, a sua orelha atenta, o seu olfato sagaz, e sendo o cão um animal doméstico, carente, dependente e que assume sentimentos próximos do humano, é nele que recai a minha escolha»
Lendo bem, ao sabermos como decorreu a infânca de Sara, entre uma espécie de «sequestro» e um ilimitado espaço de liberdade criadora, o fio do nosso imaginário desenho o desenho da menina que ela ainda parece, julgamos perceber donde nasce a fascinante alegoria do cão. A menina estava sempre alerta como ele, o cão, sabendo, como todas as meninas, os modos de inventar para além das coisas, entre a crueldade e o contentamento.Sara Maia viveu uma infância dolorosamente marcada por fragilidades, doenças, e por isso parmanecia em casa longos períodos: era aí que formatava a sua liberdade e onde inventava fantasmas, monstros, velhos meninos, situações incontornáveis. Surgem então narrativas, da menina cega aos velhos que tanta estranheza lhe causavam e cuja beleza, nua espécie de redenção, veio redimensionar no Ar,Co., onde estudou e onde desenvolveu as grandes potencialidades do seu imaginário. Daí muitas das suas preferências recairem em Frida Khalo, Francis Bacon, vang Gogh ou Bakthus -- referências, assinala, da sua própria formação.Os quadros da última exposição de Sara, de grandes dimensões, abriram mais um capítulo no percurso da autora e são dominados por uma força expressiva poderosa, entre o monstruoso, a ironia, o sarcasmo, o que resta da bondade da menina. Sara, cúmplice com o seu tempo, olha as distorções aociais, o real degradado dos seres, a ternura e a sua impossibilidade, criando assim (como aliás vem acontecendo na pintura de hoje) certas narrativas de um realismo impossível, bordalescas por um lado e violentas por outro, acto político também.
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