segunda-feira, maio 07, 2007

AS INSTALAÇÕES DOS INSTALADOS

instalação de Nuno Vasa

A revolução das artes durante todo o século XX, apesar das duas guerras mundiais ou talvez por isso mesmo, gerou movimentos teóricos sobre a forma plástica, a mobilidade visual e os modos de realização prática. Os museus da arte antiga, de importante significado para historiadores, antropólegos, sociólogos, técnicos de conservação, entre outros, foram ficando na rota turística e dos estudiosos. Os valores estéticos mais estáveis acabaram também por ser abalados em virtude de transformações formais inusitadas. É verdade que, a princípio, modos de formar como o dos impressionistas, conservavam a densidade pictórica, dilatando-a pelo espaço óptico, tornando-se laica, embora ainda apoiada na relação entre olhar e ver, tendo a percepção, aqui, um papel decisivo. Começa então o caminho da mudança, por se julgar que, em boa medida, as coisas representadas se pulverizavam no espaço, atravessando a consciência, a razão e as emoções. Se a qualia da pintura era a cor, eis o que importava colocar no centro da polémica, procurando definir as estruturas dessa linguagem. O que não é tonto de todo e depressa se tornou um acto redutor, no convencimento de que, antes de tudo, importava (além do ponto) entender o plano (campo) na sua geometria óbvia e na secreta, a linha e o seu comportamento, a cor e as variações dos valores lumónicos, a espessura ou textura das matérias dispostas na superfície. Este despojamento intelectual foi tornando crível o processo da cebola, a obra substantiva, calibrada, em camadas construtivas, ganhava verdade quando se limpavam as cascas e camadas expeteriores até se revelar pequena e regular - um termo absoluto mais revelador da essencialidade das formas do que ds seus trajes e adereços. Assim se limpou tudo e se orientou a nova cultura para as virtudes do movimento, como no futurismo, ou para o salto sobre as aparências, para o outro lado do visível, entre registos simultâneos de vários pontos de vista, como mo cubismo. Até à tela branca e ao rasgão laminar que Fontana lhe aplicou..Mais tarde, o pouco sabia a pouco e os novelos permitiram recuperar o esplendor das antigas tapeçarias e a distorção expressiva das figuras, como em Bacon, fazia-nos regressar à aproximação do real, não por simples sentido mimético, mas na validação expressionista dos efeitos protoplásmicos da matéria distorcida, esses flashes que tantas vezes nos assaltam aqui e além. Novas práticas simultaneamente construtivas e desconstrutivas atravessaram o universo da criação artística, enquanto os autores mais insatisfeitos começavam a geminar outros processos, matérias, materiais, levando a pintura e a escultura para um espaço absurdo, por vezes vagamente arquitectónico, com máquinas imóveis ou animadas, no uso de restos da civilização industrial, ferros, madeiras, aço, e, por outro lado, restos humildes do cultivo da terra, um ramo ou uma flor no topo de um monte de areia dentro da galeria. Ou só areia para nos impedir de disfrutar «de dentro» o assentamento de pequenos cristais. Este é o domínio, agora novamente em voga, das instalações, formação com base em processos híbridos, mais ou menos complexos. E aqui chegamos a uma exposição da galeria SOPRO, onde se apresenta a impositiva instalação de Nuno Vasa. Latas de tinta, de dimensão variável, acumulam-se no espaço, embargando substancialmente a entrada. «Impedidos de entrar ou sair - diz Pinharanda - somos, mais uma vez, na genealogia de obras de Nuno Vasa, confrontados directamente (mas agora numa situação inesperada fornecida pela liberdade de expressão da arte contemporâmea) com a angústia tipificada do artista tradicional: a metáfora do espaço branco esperando uma qualquer inscrição ou rejeitando toda e qualquer representação. «Acto», assim se chama o acto, é uma lata de tinta branca entornada na fronteira entre o interior da galeria e o seu acesso exterior - impedindo qualquer entrada ou saída. De novo se estabelece uma forte relação física entre a acção da obra e o espectador». Não é uma relação feliz e nem sequer agressiva. É um adiamento. Um acto académico (de hoje) que adverte o espectador de duas coisas possíveis: imaginar sentidos ou voltar criativamente para casa.

6 comentários:

Betty Coltrane disse...

Gostei do texto, embora denso de significados que não serão talvez perceptíveis para o leitor menos versado nestas coisas... A instalação que referiu parece-me muito interessante - procurarei ir até lá! Obrigado pelas sujestões que aqui vai deixando. A arte contemporânea é uma das áreas mais fascinantes e mais difíceis de estudar, para mim - o que torna a sua reflexão muito mais interessante!

Abraço

Vera

jawaa disse...

As suas reflexões sobre arte, embora muito densas, ensinam-me sempre a compreender um pouco mais daquilo que conheço pouco. Obrigada, pois, mas devo confessar que eu seria das que voltaria para casa... nem sei se criativamente.

naturalissima disse...

Dentro da complexidade da arte e sua variedade, procurei neste longo texto, depois de o ter lido 2 vezes, sentir e absorver o mais que pude a lição que nos dá.
São sugestões também que podemos aproveitar como passatempo nos dias mais livres.

Uma boa semana tio meu
um beijinho à tia Mami.
Daniela

Betty Coltrane disse...

bem, de facto despertou-me a curiosidade por ser de tal natureza... quero ver a concretização de tal ideia, para ver se de facto dá para ser criativo ou não! =)

abraço

Carla disse...

Olá,
Agradeço a visita e o comentário no feelings, estava precisamente a ponderar alterar a cor das letras para branco, de qualquer forma agradeço a sugestão.
Beijo e boa semana.

croqui disse...

Parabéns! excelente blog! conteúdo de facto muito interessante e enriquecedor para o leitor!

voltarei com mais tempo.

c®oqui