quarta-feira, agosto 22, 2007

E ENTÃO JÁ NÃO SEREMOS VERDADEIRAMENTE OS FILHOS DA REVOLUÇÃO FRANCESA

Joseph Weiler

QUE REVOLUÇÃO NOS RESTA?

A entrevista que Joseph Weiler concedeu ao expresso, no dia 11 de Agosto, tritura-nos com uma linguagem sacudida e democraticamente aterradora. É preciso reflectir com ele, um homem especializado em Direito Europeu, mesmo que não seja, em rigor, um europeu -- segundo as considerações iniciais das jornalistas Cristina Peres e Luisa Meireles. Se não existe governo na União Europeia, porque «não existe nenhum momento na nossa vida cívica como cidadãos europeus», que fazemos? Há solução para isso?

Joseph Weiler: «Primeiro, temos de admitir o problema e não fingir que ele não existe, ou que as medidas previstas funcionam. Por exemplo, aumentar o poder do Parlamento Europeu. Sabemos que não é a solução completa. É engraçado, é um dos mais espectaculares erros sobre a integração europeia. Há cerca de 20 anos, o meu primeiro livro foi sobre o Parlamento Europeu, e escrevi na altura que a taxa de afluência às eleições era muito baixa. Não era surpreendente porque o PE não tem poder, então porque é que as pessoas iriam perder o seu tempo a votar? Previ -- e esse seria o meu erro mais espectacular -- que, à medida que o PE ganhasse poder real, a afluência às eleições aumentaria. Nos últimos 25 anos, ele foi ganhando imenso poder, tem hoje competência legislativa e poder de co-decisão com o Conselho, mas a taxa de afluência declina consistentemente. Mais poder e menos participação! As pessoas na Europa não parecem estar preocupadas, mas preocupa-me que elas não se preocupem. Isso mostra que já perderam muita sensibilidade cívica. A vida é boa, para quê preocupar-me? Sou um consumidor de resultados políticos, não um cidadão pró-activo.»

A União Europeia pode desaparecer?

Weiler: Não. Mas pode haver uma mudança profunda na maneira como pensamos em nós próprios. Veja um exemplo perigoso: na Grécia, as pessoas dão aos seus filhos nomes de Hector ou Helena e falam uma língua que se parece com o grego antigo. Mas não existe conexão entre esta gente e a cultura da Antiguidade. O mesmo se passa no Egipto, não existe nenhuma relação entre a sociedade egípcia actual e a grande civilização dos faraós. O perigo não é que a União Europeia desapareça, mas que continuemos a acreditar que somos filhos da Revolução Francesa. Não há uma conexão real com a herança do Iluminismo. A herança da Revolução Francesa é o Estado Republicano, o Estado dos cidadãos. Isso desaparecerá. Continuaremos a dizer as palavras, mas já não seremos verdadeiramente os filhos da Revolução Francesa. Este é o grande perigo e é trágico. O défice no processo de governança europeia contribui para isso.

1 comentário:

P. Guerreiro disse...

Na entrevista de Joseph Weiler encontrei o absentismo eleitoral como sintoma do descrédito de valores tradicionais, neste caso o Estado dos cidadãos, herança da Revolução Francesa. Diz Joseph Weiler que nos últimos 25 anos o Parlamento Europeu ganhou imenso poder e refere como exemplo a competência legislativa, na prática a criação das regras com que regulamos a vida em sociedade a todos os níveis. Sem dúvida poderoso, logo perigoso.
No entanto parece-me que a abstenção não provocou uma modificação na relação das forças políticas no Parlamento Europeu. Quero com isto dizer que as forças políticas internas de cada país projectam a sua importância, no momento, para o Parlamento Europeu. Quantos Eleitores Portugueses terão a noção de que lado da bancada estão os deputados eleitos para o parlamento, dividem-se por países, famílias políticas (Tendo em conta a lógica original), por países pobres e ricos, será que se dividem?
Pode parecer parvoíce o que estou a dizer mas revela um desconhecimento geral da máquina extremamente complicada que é o Parlamento Europeu.
Será verdade que em países periféricos, pouco numerosos e com carências económicas, não se consiga vislumbrar que tipo de propostas importantes poderão apresentar os seus Euro deputados, propostas com hipóteses de ser aceites pelas facções reais, forças gravitacionais, a Alemanha, a França, a Inglaterra, a Espanha, a Itália. A política Europeia é definida por esses governos e esses governos quem os elege são as populações locais. Para todos nós, Europeus, as eleições locais são manifestos de sobrevivência individual. Portugal é Portugal porque existem eleições internas que elegem um governo que defende uma constituição, uma fronteira, um governo, uma república, uma democracia. Também isto é verdade para todos os outros estados membros. E isto basta-lhes, tanto para eleitores como para governantes que se sentem desresponsabilizados para as políticas comuns. O vazio reflectido nas eleições para o PE é prova da distância existente entre as principais potências europeias e do fracasso para explicar a sua importância. Como exemplo, um francês sabe que a defesa dos interesses franceses é feita pelo presidente da república francesa e não pela união europeia, pelo menos é isto que ele sente mesmo que não o admita (Já para não falar do chumbo Francês à constituição).
Aqui nunca se discutiu a República Europeia e como dizia o outro, “A tradição já não é o que era:”.