Percebi tarde o desamparo
de haver esquecido em casa
esse entrave,
segredo para cada retorno
ao esconderijo
de todas as urgências.
que substitui a mão de ferro
e o seu batimento
por cada volta de quem chega
ao lugar multiplicável,
entre o sofá e a sua negação.
Eu sabia o que significa
ficar preso na rua,
sob a luz crua,
impedido sem prazo
de refazer o esconderijo
onde inventamos
o encantamento
de quando nos entregamos,
descalçando os sapatos,
ao prazer morno da lassidão
e às memórias
de todas as histórias inteiramente lá fora.
Cá fora estou,
horas a fio, enfim,
que o dia levou tempo para o entardecer
a fim da noite tecer
e as luzes dos outros tardiamente,
pobre gente em todo o caso chegando a casa,
contempoprânea da última viagem
do último eléctrico rangente, atroador e plangente.
Comecei então a atravessar a cidade com o fim de alcançar a casa de meu avô.
Uma noite de sono em caridade.
A mão de ferro da porta dele é velha, pintada de prata e ainda grata no seu bater já espalmado, de lata.
E agora a mão de carne empurra o ferro da mão prateada, quase sem tinta e amolgada,
barulho inquietante, parece enorne no silêncio restante.
Se o avô morreu não sei, nem sei se o levaram para qualquer outro lugar ou fim.
Sei, isso sim, que me tornei de súbito vagabundo, neste compacto cimento do mundo.
Sem-abrigo, impensavelmente antigo, enrolado sob a mão de ferro pendurada:
Espécie de vida amargurada
e os meus olhos a sangrar mais tarde já no emergir da madrugada.
1 comentário:
Tocante a sua escrita, gostei muito dos seus dois últimos posts.
Obrigada pela passagem pelo meu lugar e pelos comentários. Só hoje pude andar por aqui, outros afazeres prazeirosos me vão ocupar por todo o mês.
Até breve.
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