sexta-feira, janeiro 12, 2007

O CARTEIRO JÁ NÃO BATE À PORTA




fotos rocha de sousa
O que mais me fascinava na minha infância era a chegada do carteiro, que batia com uma só pancada no batente da porta da rua e gritava arrastadamente correio.O homem apoiava o grande saco de cabedal no poial (a mala), e retirava de lá, em resmas, as cartas que meu pai recebia em abundância. Todos os dias acontecia assim e era certeiro.
Quando vim estudar para Lisboa é que tomei contacto com as caixas de correio por habitação, no hall dos prédios, casinhas como pombais, de ranhuras na parte superior. Enquanto houve porteiro, sinal luxuoso da civilização, as casinhas eram bem conservadas e os pombos-correio
retirados à tarde ou à noite, pelos residentes do edifício. As civilizações parecem grandes barcos à vela e todas elas se afundaram, no passado, com o peso cada vez maior dessas lonas e o lixo que acumulavam. Assim também acabaram os porteiros e as casinhas de lata começaram a ser desrespeitadas por meninos ladinos, brancos e pretos, enquanto os mais velhos, na esquina da rua, fumando o seu cigarrinho, se preparavam para coisas de homens, mais arriscadas e produtivas.
Hoje, em muitos lugares da cidade, ou da civilização decadente, os carteiros deixam o correio em lances de porta a porta, ou no senhor Silva, merceeiro, vizinho dos vizinhos todos.
Era eu menino, vejo agora nitidamente, e todos nós associávamos a vinda do correio com a chegada à cidade de um combóio madrugador, de passageiros e mercadorias, conhecido por combóio da manhã ou combóio do correio.
Rocha de Sousa

1 comentário:

jawaa disse...

É o progresso que chega e atropela tudo. Não tarda, ninguém aprende sequer, na escola, a usar a mão para desenhar as letras...
Gostei muito deste espaço.